sexta-feira, 29 de junho de 2012

Diário de uma professora (quinta parte)



Eu não conheci o Joãozinho, mas ele não deve ter sido uma pessoa “fácil”. Daqui a umas duas ou três postagens, vou comentar alguma coisa a mais sobre ele, a partir da leitura das anotações que fazia nas margens de livros que lia. Por incrível que pareça, ele “dialogava” com os autores, sendo seu predileto o autor português Alexandre Herculano. Nas anotações, ele corrigia, discordava, acrescentava... Veremos isso mais adiante. O fato é que ele era inquieto, exigente, para dizer o mínimo, e paramos por aqui. Isso deve ter sido um dos fatores que levou a família a tantos deslocamentos. Elisa sempre pelejando, dando aulas e cuidando dos filhos, Joãozinho descontente, irritado com a política, com os fregueses, com o lugar.

Por volta de 1910, depois de Elisa ter conseguido sua tão desejada remoção para São Paulo, Joãozinho vai para Tatuí (SP) e depois para Barretos (SP). Elisa e filhos o acompanham a Barretos, cidade localizada no noroeste do estado de São Paulo, na Região de Ribeirão Preto(*).

A cidade tem uma forte tradição pecuária, de tropeiros, e grande influência mineira. Segundo a página da Prefeitura de Barretos na internet, 70% da população tem origem em famílias mineiras. Na época em que se mudaram para lá, Barretos era uma cidade recém-emancipada, pequena, mas com um setor dinâmico em gestação: entreposto de gado gordo e magro, charqueadas e frigorífico.

Vamos ao Diário.


 Ana Wagner Wey (mãe de Elisa)


O Diário - Parte V

Joãozinho tinha o seu gabinete dentário à Rua Boa Morte, quase no centro da cidade [São Paulo]. Ele se aborrecia, porque ficava muito longe da nossa residência. Às vezes, amanhecia chovendo e ele não ia ao gabinete, porém mais tarde, o tempo melhorava e os clientes apareciam. Outras vezes, dava-se o contrário. Ele ia ao gabinete e o tempo mudava; os clientes não iam e ele ficava às moscas. Resolveu, então, ir trabalhar em Tatuí, a convite de um amigo.

Foi muito feliz nessa cidade e após 8 meses de ausência, voltou a São Paulo, trazendo algumas economias. Mais tarde, ele teve um convite para trabalhar em Barretos. Foi ver a cidade, gostou e resolvemos que mudaríamos para lá.

Barretos era, nesse tempo (1910), uma cidade nova, com luz elétrica péssima, ruas sem calçamento e, portanto, muita poeira, terra vermelha e um clima abrasador. Custei a acostumar-me ali, pois eu lecionava numa sala pequena, com 45 alunas e o sol penetrando até metade da sala. O calor era sufocante. Quando as alunas se retiravam, eu ia para o meu quarto e ficava em repouso algum tempo, pois sentia que tudo girava ao redor da minha cama. Uma ameaça de insolação! Alguns meses depois, o prédio do Grupo Escolar ficou pronto e as escolas foram anexadas.

Joãozinho teve, de início, muito trabalho no gabinete; trabalhava das 6 da manhã às 6 da tarde, com pequeno intervalo para o almoço. À noite, lecionava português a alguns rapazes.

Eu também tinha alunas à noite e entre elas, uma senhora de 60 anos, analfabeta e que aprendeu a ler em 6 meses. Um dia, disse-me ela: Dª Elisa, eu vou parar de estudar, porque a tabuada não entra na minha cabeça. Só consegui decorar até a casa do 5.

Concordei e dei-lhe o seguinte conselho: quando a senhora tiver necessidade de fazer uma conta em que tenha de trabalhar com as casas do 6, 7, 8 e 9 pode perfeitamente, olhar na tabuada.

Ela achou muita graça e disse que eu tinha razão.

Fomos muito felizes em Barretos. Lá nos demoramos 5 anos, adquirimos duas boas casas e economizamos algum dinheiro.

Romeu frequentou o Grupo Escolar algum tempo e, por política, saiu. Começou, então, a estudar piano; mas não gostava e passou para a flauta, onde fez progressos.

Quando se abriu o Grupo Escolar de Barretos, eu matriculei Romeu no 1º ano. Ele já estava alfabetizado, mas tinha uma caligrafia feia e, por essa razão, achei que devia frequentar o 1º ano. Alguns dias depois, sendo pequeno o número de alunos no 2º ano, o Diretor levou Romeu e outros alunos do 1º para o 2º ano.

Quinze dias mais tarde, o professor do 3º ano, precisando completar o número de alunos de sua classe, foi buscar Romeu. E assim, em 1 mês, ele passou do 1º para o 2º e do 2º para o 3º ano.

Lúcio e Olga também foram alunos do Grupo Escolar, onde eu lecionava. Fui sempre professora de 1º ano, no qual me especializei. Trabalhei 31 anos como professora e, oitenta por cento, fui professora de 1º ano.

Em 1913, nasceu Dulce, em Sorocaba. Nessa ocasião, Joãozinho insistiu para que eu abandonasse o magistério; mas eu, que sempre trabalhei por vocação. Não concordei. E fiz muito bem, pois hoje tenho um bom ordenado como professora aposentada e não dependo de ninguém.

Compramos em Barretos duas casas, em frente ao Grupo Escolar. Fomos morar numa e a outra alugamos a uma fazendeira que acompanhava duas netas, um neto e uma bisneta. Todos eles eram meus alunos particulares. Era uma família muito distinta e bondosa. Olga afeiçoou-se muito a uma das meninas – América.

Um dia, Olga, que contava 6 anos de idade, veio a mim e disse: Mamãe eu quero me batizar e desejo que América seja minha madrinha (os nossos filhos não eram batizados, porque Joãozinho se opunha). Respondi-lhe: isso é com seu pai. Ela, então foi à sala, onde o pai lia os jornais, e fez o mesmo pedido. Ele respondeu: isso é com sua mãe. Quando Olga voltou a falar comigo, Joãozinho veio atrás dela e disse-me: “sei que você quer muito batizar os nossos filhos, pois eu não me oponho”. Que alegria!

Os batizados foram efetuados 15 dias depois e eu comuniquei o ocorrido à Mamãe que chorou de alegria, pois ela não se conformava de ter netos pagãos. Mamãe era uma santa criatura, de uma bondade sem par e, respondendo minha carta, dizia: “Elisa, a minha alegria ao saber que os netos foram batizados, foi tão grande que chorei copiosamente e abençoei você, seu João e as crianças.”

No ano seguinte ao do nascimento de Dulce, perdi papai: morreu de repente, de uma angina pectoris. Eu não pude vê-lo, pois a distância de Barretos a Sorocaba é grande e naquele tempo não havia trens noturnos. Mesmo que houvesse, eu não chegaria a tempo para o enterro.

Minha irmã Júlia e meus irmãos João e Cornélio eram ainda solteiros quando Papai faleceu; de modo que Mamãe conservou-se na mesma casa até casar todos os filhos. Daí em diante, desmontou a casa e passou a viver conosco.

Cid [o quinto filho de Elisa], também nasceu em Sorocaba e, quando estava com 40 dias, pedi minha remoção de Barretos para Avaí (SP), localidade próxima de Bauru. (continua na próxima semana).


Vista de Barretos, SP (Fonte: Prefeitura Municipal)
 
Notas:
 
(*) Barretos, SP

Histórico

O alferes João José de Carvalho e Antônio Francisco Diniz Junqueira, vindos de Minas Gerais, foram os primeiros desbravadores da região compreendida entre os rios Grande, Pardo e Cachoeirinha.

O primeiro formou a fazenda Palmeiras, banhada pelo ribeirão do mesmo nome e Antônio Francisco tomou posse das terras às margens do rio Pardo, criando a fazenda Pitangueiras.

Como capatazes dos colonizadores, vindos também de Minas, tomaram posse das terras à margem esquerda do ribeirão Pitangueiras, Francisco José Barreto e seu irmão denominaram essa gleba de "Fortaleza".

Após a morte de Francisco José Barreto, em 1848, seus filhos, auxiliados por um vizinho, Simão Antônio Marques, construíram uma capela sob a invocação do Divino Espírito Santo, em torno da qual foram se fixando novos moradores.

Em 1874, com a criação da Paróquia do Divino Espírito, no Arraial "dos Barretos", foi também instituída a Freguesia. Espírito Santo de Barretos passou a Município em março de 1885, alterando seu nome para Barretos em 06 de novembro de 1906, conforme Lei nº 1021. Durante sua evolução histórica, o grande território foi sofrendo inúmeros desmembramentos, quando seis Distritos sob sua jurisdição foram elevados a Município.

Fonte: IBGE
Disponível em: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1

O clima de Barretos:
O clima do município é predominantemente quente e seco. No verão são registradas temperaturas médias que variam entre 30 e 38 graus, no inverno a variação média cai dos 13 aos 20 graus.


quinta-feira, 28 de junho de 2012

Alguns plantam, outros cortam




Renato Muniz Barretto de Carvalho

Insensatos tempos ou insensatas atitudes? Da janela do meu apartamento, eu observo distraído o ritmo frenético com que trabalham os pedreiros de uma construção próxima. Eles não têm sequer muito tempo para me observar ou o que se passa nas redondezas, tão envolvidos em levantar rapidamente as paredes do prédio que constroem. Eu os vejo de esguelha, absorto em meus pensamentos, em minhas preocupações. Eu penso na obra vizinha e em outras situações.

Trata-se de um prédio pequeno, não sei ainda se de dois ou de três andares. Não vejo, até agora, nenhuma janela. Se tiver janelas, será na parte da frente. Já penso nos aparelhos de ar condicionado que, certamente, serão instalados, e nos gastos com eletricidade. Outra coisa que me espanta é que o tal prédio ocupou cem por cento da área do terreno. Isso mesmo! A totalidade do terreno. Nenhuma área verde, nenhum jardim, nem estacionamento, nenhum espaço entre os três vizinhos, nenhum afastamento. Parede com parede. Como a Prefeitura aprova uma obra assim? E olhe que a cidade tem um Plano Diretor, um Código de Edificações e uma Lei do Uso e Ocupação do Solo!

Entre os motivos de eu prestar maior atenção ao prédio em construção agora é o fato de, tristemente, constatar que uma árvore existente em frente à janela do escritório de onde escrevo essas linhas ter sido erradicada na calada da madrugada, antes de todos acordarem, a golpes de facão. Aliás, uma madrugada friorenta, já no fim do verão seco e quente que caracterizou este ano de 2012.

Dirigi um protesto e uma indagação ao infeliz funcionário, que também faz o papel de jardineiro, ou verdugo, mas ele virou-se para mim e disse: “ordens são ordens!” O síndico mandou cortar. Por quê? Não sei. Qualquer desculpa serve: a árvore está velha, a copa impede a iluminação do pátio e causa insegurança, caem folhas e elas “sujam” o canteiro, coisas assim, todas elas muito inconsistentes e que, certamente, dependem muito mais do caráter autoritário, do humor, das pressões, do desconhecimento e da maneira como se organiza o pensamento conservador e retrógrado de uma parcela da nossa sociedade com relação ao meio ambiente e à vida. Atrapalha, corta! Erradica! Extirpa! Mata!

Naquele instante, tive vontade de chamar o caminhão de mudanças e me mudar para outro lugar, mas cheguei à conclusão que teria de pedir ao motorista do caminhão dirigir até Marte ou em direção a outra galáxia.

Os dois fatos, a construção de um prédio sem um único milímetro de área verde e a derrubada insana de uma árvore, não são fatos isolados. Acontecem com mais frequência do que imaginamos. São mais comuns do que o plantio de árvores ou os investimentos em obras ambientalmente corretas.

As consequências? Enchentes cada vez mais constantes, por causa da impermeabilização, ilhas de calor nas cidades, maior gasto com energia elétrica, menos vida, menos verde (a não ser que pintem as paredes do prédio de verde!). Mais tristeza e solidão. Existem alternativas? Sim, claro! É só saber ver de outro modo, conduzir a vida de outra maneira, agir diferente, e plantar mais.

Publicado originalmente no Jornal Clarim. Disponível em:   http://www.clarim.net.br/

domingo, 24 de junho de 2012

O Diário de uma professora (parte IV)

Elisa e netos, na década de 1930


Formada em 1901, como professora primária, Elisa Wey voltou a Conchas (SP), onde morava sua família, e tornou-se a primeira professora da cidade. Foi aí que se casou com João Gonçalves Muniz Barretto, o Joãozinho, e onde nasceu seu filho mais velho: Romeu. Logo depois, Joãozinho resolve ir a São Paulo estudar e Elisa, sentindo-se só, pede remoção para Santa Isabel (SP), cidade mais próxima da capital. Vamos ao Diário.

Diário de uma professora - Parte IV

[Longe do Joãozinho, que estava em São Paulo estudando, e com dois filhos pequenos (Romeu e Lúcio), Elisa pede sua remoção de Conchas. As regras de transferência da época não permitiam que fosse para a capital. Vai, então, para o município de Santa Isabel, próximo de São Paulo, com muita tristeza por ter de deixar Conchas, a família e as alunas].

Com duas crianças, como poderia eu lecionar numa cidade onde não tinha sequer uma pessoa conhecida?

O transporte de São Paulo a Santa Isabel (*) era feito do seguinte modo: de trem até Poá e daí até a cidade, em carro de bois – doze horas. A mudança foi toda em lombo de burro, da Avenida Celso Garcia até lá – 3 dias.

Resolvemos, então, que minha sogra me acompanharia até o fim do ano, ocasião em que Joãozinho terminaria o seu curso de odontologia.

A minha vida tornou-se então mais laboriosa, com dois filhos e a escola. Eu deveria, logo que Joãozinho se formou, deixar a escola que muito tempo me tomava; mas em Santa Isabel, cidade paupérrima, não poderia viver com o que ele ganhasse no gabinete dentário, pois os clientes eram raríssimos e queriam pagar, por uma extração, uma dúzia de ovos ou um frango. Nesse tempo, uma dúzia de ovos custava 400 réis e um frango 500.

É verdade que pagávamos 15$ de aluguel de casa e tudo era muito barato. O meu ordenado era de 255$, muito dinheiro nessa ocasião (**).

Virgílio, meu mano, também professor, a nosso convite, resolveu pedir e conseguiu uma remoção para Santa Isabel. Ficamos em família (ele era casado com Nenem, minha cunhada duas vezes, pois ela era irmã de meu marido).

Como Joãozinho tinha pouco serviço em Santa Isabel, veio trabalhar em São Paulo, nas Classes Laboriosas (***).

No dia 3 de janeiro de 1909, nasceu aqui em São Paulo (eu estava de férias) nossa filha Olga e eu, com 20 dias apenas após o parto, regressei a Santa Isabel, pois as férias haviam terminado. Com que dificuldade lutei: nessa ocasião, com 3 filhos pequenos e precisando sair para lecionar! Só eu sei os apuros por que passei.

Olga foi uma criança muito bonita e boazinha, porém, ao completar 10 meses, ficou muito doente e eu tive necessidade de pedir uma licença afim de vir a São Paulo, para submetê-la a um tratamento.

Esteve muito doente a nossa filhinha, esteve às portas da morte, com uma gastro-enterite. Felizmente, sarou. Nessa ocasião, dando muitos passos e com uma carta do chefe político de Santa Isabel ao Dr. Rubião, consegui minha remoção para aqui (São Paulo). Vim reger a 1ª Escola Feminina da 5ª Parada da Estrada de Ferro Central do Brasil. Fomos morar numa ótima casa (chácara toda arborizada) na Vila Gomes Cardim. Aí eu tinha a minha sala de aula e todo o conforto para a família.

Minha sogra e uma das minhas cunhadas moravam conosco. As crianças, isto é, Romeu, Lúcio e Olga gozavam ótima saúde e tinham muito espaço para brincar. Tínhamos galinhas e, portanto, fartura de ovos. Lúcio, com 2 anos e pouco, andava ainda de camisola. Ele ia ao galinheiro e esperava, pacientemente, que as galinhas botassem. Então, quebrando uma das extremidades do ovo, chupava-o ainda quentinho. Era um menino forte, gordo, e muito esperto. Não sabendo ainda contar além de 12, ia pondo os ovos na camisola e trazia-os para dentro de casa, dizendo: aqui estão duas dúzias e dois ovos; eram 26.

Uma ocasião, o inspetor escolar, Sr. Mariano de Oliveira, visitou a minha escola. Em dado momento, pediu-me um copo d’água, dizendo estar com muita sede. Afirmei-lhe que tínhamos água ótima, de cisterna, e fui busca-la. O Sr. Mariano tomou apenas uns goles e deixou o copo quase cheio. Terminada a visita escolar, despediu-se o Sr. Mariano e eu, intrigada, pois o homem dissera-me que estava com sede, fui examinar a água. Estava muito limpinha, mas exalava um mau cheiro. Examinei as vasilhas da cozinha que estavam com água e notei o mesmo mau cheiro em todas elas. Chamamos uma pessoa para limpar a cisterna e então foi encontrada uma cobra morta, já em adiantado estado de putrefação!(Continua na próxima postagem).



(*) Santa Isabel (SP)
Santa Isabel está localizada a 55 km de São Paulo, uma distância que, hoje, dependendo do trânsito, pode ser percorrida em cerca de uma hora.

O município de Santa Isabel localiza-se no estado de São Paulo, na região metropolitana da capital. Microrregião de Guarulhos [...]. Conhecida como Paraíso da Grande São Paulo, a cidade é uma das três localidades que possui exemplares de uma espécie da Mata Atlântica, a árvore Buchevania Igaratensis.

O nome da cidade é resultado de uma homenagem a Santa Isabel de Aragão, rainha de Portugal. O município originou-se de um povoado conhecido como Morro Grande, em meados de 1770. Após um ano de existência o povoado prosperou, utilizando agricultura e pecuária como principal fonte de renda. Devido ao crescimento da população, Morro Grande foi elevado a condição de Freguesia “Paróquia Santa Isabel”. Já em 25 de junho de 1812, tornou-se Vila Santa Isabel, posteriormente, em 1 de junho, elevou-se a condição de município, passando a se chamar Santa Isabel.
Texto: Bruna Aparecida Nascimento
Fonte: Santa Isabel on line
Disponível em: http://www.santaisabelonline.com.br/cidades/santa-isabel/

Ainda sobre Santa Isabel, na Wikipedia
Por força da Lei Estadual n° 135, de 30 de maio de 1893, a referida Vila [Santa Isabel] foi elevada a categoria de município e foi designado sede de comarca, através de Lei n° 80, datada de 25 de Agosto de 1892.
Em 18 de Abril de 1870, Santa Isabel contava com uma cadeia, uma Casa de Câmara, e, além da igreja matriz, as igrejas do Rosário e de Santo Antonio, hoje demolida.

Vista geral de Santa Isabel


Santa Isabel segundo o IBGE
Nas proximidades do rio Jaguari, afluente do médio Paraíba, em zona serrana, nasceu a localidade ao lado de uma cruz e uma capela erigida em homenagem a Isabel de Aragão, a "Rainha-Santa" de Portugal, daí a invocação à Santa Isabel.

Com o crescimento do povoado, a capela de Santa Isabel foi elevada a freguesia, em junho de 1812 e, no mesmo ano, criada a Paróquia, sob jurisdição da Vila de Moji das Cruzes. Em julho de 1832 foi criada a vila (Município), primeiramente na comarca de São Paulo e, a partir de 1852, na de Jacareí. Entre 1868 e 1938 foram-lhe anexados os Distritos de Igaratá e Arujá, hoje Municípios. Com a construção do eixo rodoviário São Paulo-Rio de janeiro e a proximidade com a Capital do Estado, o Município progrediu bastante passando a se industrializar.

População em 2010, segundo o IBGE (Cid@ades): 50.453 habitantes

(**) As moedas
Réis é o plural do nome das unidades monetárias de Portugal, do Brasil e de outros países lusófonos durante certos períodos da história (singular: real).

Conto de réis é uma expressão adotada no Brasil e em Portugal para indicar um milhão de réis. Sendo que um conto de réis correspondia a mil vezes a importância de um mil-réis que era a divisionária, grafando-se o conto por Rs. 1:000$000 ou R$ 1,000000 (sendo o real 1/1.000.000 de um conto-de-réis em representação matemática decimal atual), pois o réis tinha sua representação real-imperial em "milésimos-de-mil" contos-de-réis), sendo uma moeda de grande-valor intrínseco e imperial, com representatividade em aproximadamente oito gramas de ouro, como também assim o era a representação da libra esterlina também imperial, de então, tanto no Brasil como em Portugal e Algarves.

No Brasil, esta moeda foi substituída pelo cruzeiro, em 1942, na razão de 1 cruzeiro por mil-réis então circulantes.
Fonte: Wikipedia
Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/R%C3%A9is





Entendeu? Vamos ver um exemplo:
“Quanto era 1 conto de réis? Para quem não se lembra dos pronunciamentos do presidente Getúlio Vargas na Voz do Brasil, a quantia de 1 conto de réis pode mesmo confundir, pois a unidade monetária já era um múltiplo de mil, não havendo os submúltiplos (centavos de mil-réis). Assim: Padrão Monetário (Mil-Réis) = 1$000 Rs, com submúltiplos (Réis), exemplo: 200 Réis = $200 Rs: 1 conto de réis = 1.000 Mil-Réis ou 1:000$000 Rs (1 milhão de réis), portanto.”
Fonte: O Caixa
Disponível em: http://www.ocaixa.com.br/bancodedados/dolaranualmedio.htm

Pelo que entendi, o salário da Elisa dava para comprar 500 frangos. Quantos frangos um professor primário no Brasil pode comprar hoje com o seu salário atual?

Segundo o Instituto de Economia Agrícola (SP), o quilo do frango limpo custava, em maio de 2012, R$ 4,07. Um bom frango pesa mais de dois quilos. Vamos imaginar R$10,00.

Qual o salário de uma professora do ensino fundamental hoje? Segundo o Ministério da Educação (MEC), o piso foi definido em R$ 1.451,00. Nem todos os estados e municípios pagam este valor.  

Se você teve um bom professor ao longo da sua vida, não vai ser difícil fazer as contas.

(***) As Classes Laboriosas
Trata-se da atual Associação Auxiliadora das Classes Laboriosas (AACL), fundada em 31 de maio de 1891.

Histórico (segundo a própria AACL)
"Um paciente trabalho de pesquisa que mobilizou entre outros órgãos estruturais, fontes da Secretaria Estadual da Cultura do Estado de São Paulo e do Centro de Memória Sindical, além de extensa bibliografia, abriu os caminhos que nos levou a descobrir as origens e a missão da mais antiga entidade beneficente e sem fins lucrativos do País, hoje denominada Associação Auxiliadora das Classes Laboriosas. No ano de 1891, um grupo de carpinteiros e pedreiros se uniu para garantir assistência médica para suas famílias.

A proposta ia além disso. Defender os ideais trabalhistas em relação à jornada de trabalho. É preciso retroagir no tempo para atender tão justa reivindicação. O Estado republicano instalado no Brasil em 1889, em uma sociedade de traços ideológicos marcadamente escravistas, não garantia ao trabalhador outro direito que não o de ser livre para vender sua força de trabalho. Cumprindo longas jornadas que chegavam 14 horas, sem direitos trabalhistas ou outras garantias sociais, o nascente operariado brasileiro no qual se incluía um número significativo de mulheres e crianças não foi aquinhoado com os direitos de cidadão, como o do voto, proibidos às mulheres e analfabetos. Suas reivindicações eram tidas como "desordens" e sobre eles recaiam os preconceitos contra o trabalho manual do estrangeiro grande parte deles eram imigrantes italianos e pobres. Concentrados em bairros operários, em geral formados nas proximidades das fábricas, os trabalhadores desenvolveram formas de vida características, marcadas por profundos laços de solidariedade e identidade.

Em 1919, segundo pesquisas de Helio Negro e Edgard Leunroth, uma família operária de quatro pessoas gastava mensalmente, em São Paulo, cerca de 207$000 (duzentos e sete mil réis, segundo moeda da época), não incluindo gastos com diversão, condução e educação. Considerando que os salários neste ano variavam entre 80$000 e 120$000, o déficit é evidente. A situação de pobreza da maior parte dos operários paulistas pode ser avaliada pelo alto índice de mortalidade infantil e moléstias diretamente ligadas às condições de higiene alimentação, como tuberculose, ou mesmo epidemias, como a gripe espanhola que assolou São Paulo em 1918, fazendo milhares de vítimas.

A Associação de Pedreiros e Carpinteiros se reorganizou abrindo espaços para outros profissionais, razão pela qual o nome foi mudado para Associação Auxiliadora das Classes Laboriosas. Se não atingiu seu ideal trabalhista, pelo menos serviu para reagir contra o descabido "caixa de empresa", que sugava os proventos dos trabalhadores quando a doença os atingia. Estes injustos descontos empurravam os trabalhadores para as Classes Laboriosas em busca de uma assistência médica digna e barata.

Dois nomes se destacaram pelo idealismo e amor às Laboriosas, Alberto Ferreira Sertié, que foi o responsável pela elaboração do estatuto e Lourenço Francisco Gomes, que adquiriu o terreno para a construção da nova sede. Sertié demonstrou estar engajado com as lutas do seu tempo e ser defensor do mutualismo, sistema que abrigou a filosofia das Classes Laboriosas, ao declarar que pretendia continuar "a prestar sua inteligência em prol desta útil Associação, com esforços redobrados para que todos os companheiros se unissem e se fizessem fortes diante da prepotência do capitalismo". No início do século as reuniões aconteciam em salões alugados ou até mesmo nas residências de associados. Folclore à parte, a casa  do tesoureiro José Lopes Calça, abrigava as reuniões das Classes Laboriosas na rua Florêncio de Abreu nº 49. O empreendedor Lourenço Francisco Gomes, pôs fim ao problema. Adquiriu o terreno para a edificação do prédio das Classes Laboriosas, na então freguesia da Sé. "O terreno era alto, seco e dele desfrutava-se belíssimo panorama", enfatizava na ocasião o responsável pela construção do novo prédio.

Rua Roberto Simonsen, 22.
Erguido em 1907, o edifício que também é chamado de Salão Celso Garcia, foi durante décadas palco de importantes acontecimentos do cotidiano da cidade de São Paulo. Durantes as duras greves e revoltas operárias que assolaram a capital nas décadas de 1940 e 1950, o prédio era constantemente usado para reuniões, discussões e negociações. No ano de 1953, que ocorreu uma grande greve, a sede das Classes Laboriosas foi considerada o grande e importante QG do movimento grevista, um marco para o movimento trabalhista brasileiro. Nas décadas anteriores, especialmente de 1910 a 1920, o elegante Salão Celso Garcia foi palco de inúmeras peças de teatro, corais e solenidades que não raro repercutiam por toda a cidade de São Paulo. Em 1910, aliás, o poeta e político Sílvio Romero falaria diante deste prédio em um importante e concorrido comício sobre a carestia de vida.


Nova Sede
No início do século XX, mais precisamente em 1907, as Classes Laboriosas construíram sua nova sede na rua do Carmo 25. Por lei municipal de 1952 o nome da rua foi mudado e o novo endereço das Classes Laboriosas passou a ser rua Roberto Simonsen, 22. As novas instalações foram ocupadas por consultórios médicos e dentários, laboratório e farmácia. Para ajudar nas despesas, o espaço restante foi alugado, instalando-se no  local o Centro Dramático e Recreativo Internacional, o Grêmio Dramático Maria Falcão e o Grêmio Dramático e Recreativo Anita Garibaldi. Uma feliz união entre o aspecto assistencial e a cultura foi fundida na mesma associação, com a participação dessas companhias teatrais. A entidade foi pioneira no Brasil a adotar o lazer (teatro, música e saraus) como terapia na cura de doenças. Só bem mais tarde, cientistas norte-americanos revelariam ao mundo a importância dessa terapia nos tratamentos de certas patologias."
Fonte: AACL
Disponível em: http://www.classeslaboriosas.com.br/modules.php?name=Conteudo&pid=1

 Família do Joãozinho. Sentado, à direita, o pai, Emílio Maurício de Faniz Muniz Barretto, 
e a mãe, Ana Jacinta da Silveira (à esquerda).


quarta-feira, 20 de junho de 2012

Mara Maciel: contadora de histórias



Contar histórias é uma arte. Prender a atenção de crianças com uma história é mais do que uma arte, é uma gostosura. E foi isso o que aconteceu no sábado, dia 16 de junho, nos jardins da Biblioteca Pública Municipal de Uberaba. A professora Mara Maciel, diretora do Centro de Educação Ambiental Sítio da Pedreira, com mais duas professoras e contadoras de histórias, encantaram as cerca de 40 crianças, e os pais, que compareceram ao Arraial das Letras da Biblioteca (sob coordenação da professora, e também contadora de histórias, Adriana Fonseca).

Num dia claro e com temperatura agradável, num ambiente gostoso e aconchegante, como são os jardins da Biblioteca Municipal, foi uma delícia ver os olhinhos das crianças brilhando de atenção, com muita vontade de participar e de responder às perguntas. Uma hora que passou correndo, sem que todos percebessem, ao sabor de histórias antigas e novas, ao som de suaves cantigas, das palmas entusiasmadas e do canto dos passarinhos. E tudo terminou com o ploc-ploc das pipoquinhas (as próprias  crianças) pulando de alegria, para satisfação dos pais, avós e demais acompanhantes.

Vamos aguardar as próximas apresentações!


















































domingo, 17 de junho de 2012

Uma professora especial (parte III)


Joãozinho e Elisa 


Quando Elisa Wey Muniz Barretto (*) nasceu, em 1883, o Brasil ainda era um império escravocrata. Em seus mais de 80 anos de vida, ela presenciou o fim da escravidão, o fim do Império, o início da República, a República Velha (da política “Café com leite” e da aristocracia rural), o Estado Novo, as duas grandes guerras mundiais, o golpe militar de 1964, as revoluções culturais que mudaram nosso modo de pensar... Ela viveu o século XX!  

Viveu, trabalhou, lecionou para crianças, teve filhos, netos e bisnetos. Teve alegrias e decepções. Acima de tudo, deixou um exemplo de carinho e bondade para as pessoas que com ela conviveram.

A pedido do neto mais velho, Sylvio, escreveu um Diário.

O Diário descreve pouco os acontecimentos políticos de seu tempo. Suas preocupações eram outras, mas suficientes para desvendarmos sua época e, como ela mesma sugeriu, através dos “rabiscos” descobrirmos uma pintura mais elaborada.

Ela não registra no seu Diário suas ideias e princípios como educadora, mas sua trajetória por inúmeras cidades paulistas, sempre como professora. O Diário Oficial do Estado de Pão Paulo, hoje digitalizado e disponível na internet, registra alguns de seus deslocamentos, algumas nomeações e outros atos. Pode-se consultar, por exemplo, as edições de 1918, de 1922, de 1923 e a de 1932.

Sua primeira regência (escola) foi em Conchas, cidade onde moravam seus pais. São várias as referências ao seu pai (Germano Wey, ou Hermann Rudolph Wey) como um dos pioneiros do município. Um historiador chega a atribuir-lhe o batismo da cidade (1). Outro historiador o menciona em artigo sobre as Bandas e conjuntos musicais de Conchas (2). A página oficial do município na internet menciona o Sr. Germano Waiss (sic) como um dos pioneiros de Conchas. O IBGE, na página “Cid@ades” cita Germano Weiss  (estava assim no original, provável erro de digitação ou desinformação) como um dos fundadores (4).

Conchas, hoje, é um município com população estimada em 16.302 habitantes (estimativa IBGE 2010). Pertence à região de Bauru, microrregião de Botucatu, e tem seus limites com os seguintes municípios: Porangaba, Bofete, Anhembi, Piracicaba, Laranjal Paulista e Pereiras. Sua economia está baseada nas atividades rurais e comerciais. Segundo o IBGE, o município tinha, em 2009, 2.474 alunos matriculados no ensino fundamental. Quantas alunas tinha a primeira classe de Elisa Wey?

Como era Conchas no início do século XX? Quantos habitantes? Quem foram as primeiras alunas de Elisa? Se alguém souber, que nos conte!

O Diário

Mamãe, cujo sonho dourado era ver os filhos formados, ficou contentíssima [com a formatura, de Virgílio, em 1900, e de Elisa, em 1901]. Ela havia prometido às crianças de Conchas que eu seria sua professora (**)

Um mês após minha formatura, fui nomeada para reger a primeira escola feminina, e Virgílio, que estava lecionando em Laranjal, conseguiu sua remoção para a primeira masculina, da mesma localidade.

Com que alegria iniciei o magistério!!! Sempre lecionei com muito prazer e consegui trabalhar 31 anos.

No dia em que me formei fiquei noiva. Casei-me aos 19 anos e casei-me por amor.

Joãozinho (***) era tudo na minha vida. Muito estudioso e com grande preparo em português, não se havia diplomado. Comprara de meu tio Pedro (irmão de mamãe), um Cartório de Paz e assim íamos vivendo.

No dia 24 de novembro de 1903, nasceu nosso primeiro filho – Romeu. Veio ao mundo muito magrinho, mas como eu tinha bom leite e abundante, criei-o ao peito e aos poucos meses passou a ser um menino robusto. Romeu foi uma criança muito boazinha e sadia. Era o nosso encanto. Praticamente foi minha cunhada Nhonhô (Elvira) quem o criou, pois ela afeiçoou-se muito a ele. Foi o nosso enlevo, a alegria do nosso lar!

Quando Romeu não havia ainda completado um ano, Joãozinho resolveu vir a São Paulo a fim de fazer o curso de Farmácia. No começo, eu não estava de acordo, pois fazia tão pouco tempo que estávamos casados e já nos íamos separar! Depois, vendo que ele muito se contrariava no Cartório, achei que devia vir. Como me doeu essa separação, a primeira! Só Deus sabe o quanto sofri!

Felizmente, fiquei morando com meus sogros e cunhados, que muito me queriam. Minha sogra foi para mim uma verdadeira mãe carinhosa.

Combinamos, eu e Joãozinho, que eu continuaria a estudar, com ele, a Língua Portuguesa. Ele mandava-me (de São Paulo) as sentenças que eu devia analisar e, na volta do Correio, eu remetia as sentenças já analisadas para que ele as corrigisse. E assim foi-se passando o tempo até que veio ao mundo o nosso segundo filho – Lúcio, três anos e meio mais moço que Romeu. Lúcio nasceu em Laranjal, no dia 21 de maio de 1907. Foi uma criança muito gorda, esperta e sadia. Aos dez meses, andou e falou.

Joãozinho, tendo se aborrecido com um dos professores da escola, passou da Farmácia para Odontologia. Ele ainda não estava formado quando Lúcio nasceu. Quatro meses depois, eu pedi minha remoção para Santa Isabel, pois a minha ambição era vir para São Paulo; porém, naquela ocasião só viriam para a Capital, as professoras que fizessem um estágio de dois anos em Comarca. Ora, Conchas não era comarca e eu já havia lecionado lá 5 anos. Esse foi o motivo da minha mudança para Santa Isabel. A minha saída de Conhas foi muito triste, pois lecionando lá 5 anos e tendo sido eu a primeira professora do lugar, tomei muita amizade às alunas e elas a mim. Foi um rio de lágrimas a minha despedida. (Continua).

(*) Em alguns documentos, e segundo sua neta Elza, o nome correto era Elisa Rosa Wagner Wey Muniz Barretto (fica o registro).

(**) Uma nota no Diário de Elisa: "A população de Conchas estava ansiosa por uma professora e sabendo da minha chegada, foi em massa, juntamente com a banda de música, à estação. Um grupo enorme de pessoas da localidade acompanhou-nos até nossa casa, onde papai fez servir uma cerveja. À noite, dançamos e ficamos conhecendo o chefe da Estação que, alguns meses depois, tornou-se noivo de minha irmã Hermínia, com quem se casou."

(***) João Gonçalves Muniz Barretto (nasceu em Mendes, RJ, em 1877, e faleceu em São Paulo, em 1956).

Localização de Conchas, SP


Notas

(1) Por que o nome CONCHAS

Já ouvi de várias pessoas que o nome da nossa cidade teria sido dado pelo Senhor Germano Wey, tropeiro vindo do Estado do Rio Grande do Sul que, constatando a grande quantidade de conchas em nosso ribeirão, nomeou este pedaço de chão com o nome do invólucro calcário dos moluscos aquáticos. 

O referido senhor, de nacionalidade suíça com pais e sogros em São Roque, filho de Francisco Wey e Ana Wey, casado com Ana Maria Wey filha de Jacob Wagner e Ana Half Wagner, foi um dos nossos pioneiros sem dúvida.

O Senhor Germano veio de Sorocaba onde se casou e teve os seguintes filhos: João nascido em Conchas no dia 20/5/1899 além de Elisa e Virgílio que em 1902 aparecem como professores de duas classes de primeiras letras, cujos alunos com bandeirolas participaram da festa feita à caravana de tieteenses que aqui veio comemorar a volta do Distrito de Paz de Conchas à jurisdição de Tietê. Se aqui chegou como tropeiro como tal não procedeu, pois se entregou à agricultura e logo em 07/01/1898 aparece como outorgante vendedor por 500$000 (quinhentos mil reis) ao Sr. Carlos Peche, de uma casa de tijolos coberta de telhas; tal casa em terreno de 40 metros de frente para a estrada para Botucatu, atual Rua Amazonas, por 57 metros de fundo,  perto da ponte sobre o Rio Chicú, atual dos Lopes, lá ainda está; Germano tinha mais terras confrontando com esse terreno e com terras de Baschoal Barone, este avô do nosso conhecido Pasqual filho de Antonio.   

Até poderia ser verdade e coubesse ao Senhor Germano o feito histórico e mérito de dar tal nome à nossa povoação, em seus primórdios, entretanto, segundo o historiador Antonio Francisco Gaspar do Instituto Histórico e Geográfico de Sorocaba, tal feito coube ao Dr. Luiz Bianchi Bertoldi; este foi o engenheiro que locou a estação nas imediações do rio Chicú, atual dos Lopes, e pelo mesmo motivo, qual seja abundância de conchas por ele constatada nas areias do referido rio, teria dado tal nome à nossa estação em 1887, chamando-a: ESTAÇÃO DAS CONCHAS. Porém um fato é certo: a incipiente povoação antes de receber a estrada de ferro ainda não tinha nome e cresceu rápida com tal melhoramento passando a se chamar Bº da Estação das Conchas; os primeiros posseiros e já bem sucedidos sitiantes da população que residia na zona rural, além de procurarem o povoado para compra de utensílios domésticos, passaram a construir casas no mesmo. O sentimento religioso já demonstrado nas tradicionais festas do Divino levou-os a solicitarem, por escrito, e prontamente atendidos pela Provisão Eclesiástica de 22/12/1890, a competente autorização do Episcopado de São Paulo para construção da Capela do Senhor Bom Jesus de Conchas; logo mais atestando o progresso da povoação criou-se o DISTRITO POLICIAL em 01/6/1892 e a seguir em 05/12/1896 o Distrito de Paz, ambos  sob a jurisdição de Tietê, como não poderia deixar de ser.

Podemos considerar o início do sentimento comunitário da pequena povoação da Estação das Conchas, aquela primeira reivindicação coletiva, reforçada mais tarde pelo pedido também por escrito, para elevação da Capela do Senhor Bom Jesus à Paróquia; este pedido foi deferido em 17/12/1899 pela Portaria Diocesana de São Paulo, pelo Cônego Tesoureiro-Mor Ezequias Galvão da Fontoura.

Não devemos esquecer que Pereiras antes desta denominação com a qual se tornou freguesia em 30/3/1876, pertencia ao município de Tatuí com o nome de Bº do Ribeirão das Conchas, sendo sua 1ª igreja reconhecida pela Diocese de São Paulo somente em 1874, por já estar de acordo com cânones eclesiásticos; era uma capela dedicada à  Nossa Senhora da Conceição do Ribeirão das Conchas. O Ribeirão das Conchas, portanto, era assim conhecido de longa data bem como por esse nome o nosso sertão. Tudo também nos levando a crer que os braganceiros para cá vieram com endereço certo: Sertões do Ribeirão das Conchas.    
          
Disponível em: http://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=7&ved=0CHQQFjAG&url=http%3A%2F%2Fwww.camaraconchas.sp.gov.br%2FAcervo%2Fhistorico%2FConchas%2F011%2520-%2520Por%2520que%2520o%2520nome%2520CONCHAS.doc&ei=r3feT4nbGIyE8QTB3o3rCg&usg=AFQjCNES5HOhGqhneD6Hk-aRsr_ZHW4dYg

(2) Bandas e conjuntos musicais da cidade de Conchas
Por Paulo Fraletti (Do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo).

As Bandas

A história das bandas musicais da cidade de Conchas, como sua própria história, está ligada à História de Pereiras, pois grande parte de seu território teve origem comum ao de Pereiras: o antigo Bairro do Ribeirão das Conchas, pertencente à Freguesia de Tatuí, com exclusão de uma pequena parte, que se ligava à Tietê.

Da mesma maneira Conchas, administrativamente, pertencera a Pereiras até 1892, quando foi criada como Distrito Policial de Tietê, e para esse município foi transferido por 7 anos (1892 à 1899), quando voltou à Pereiras, de 1899 à 1902 (3 anos), com nova passagem para Tietê, nêsse ano, agora definitivamente.

A transferência foi por obra da Chefatura de Polícia, e não da Assembléia Legislativa de São Paulo. Motivação puramente política.

Em 1887 ainda não existia banda, tanto que, no dia 21 de julho, na inauguração da Estação de Conchas dos Pereiras (Diário de Sorocaba, desse dia), segundo Sabatino Pastore e Felucho Maimone, ouviram contar que as bandas que animaram o evento, foram a Lira Pereirense, sob regência do contra-mestre José Maciel de Almeida (Mestre José) e a de Porangaba, do maestro João Gorga. A de Pereiras executara a cavatina “Santa Rosália”.

Era a primeira estação da Sorocabana, da ainda Freguesia dos Pereiras (cuja estrada não passava pela Vila, como havia sido projetada inicialmente. Conchas não existia, em 1887. Era um simples aglomerado de casas, como se nota numa foto de Pascoal Barone, na qual se vê apenas três prédios, o da Estação, o da Serraria de Germano Wey e um que não sabemos quem era o proprietário.

Com a chegada da linha férrea e a inauguração da Estação de Pereiras (em Conchas), desenvolveu-se o povoado, logo elevado a Distrito Policial, 5 anos após, em 1892, sob Tietê, como dissemos atrás, perdendo Pereiras a sua Estação, tendo a cidade que construir uma nova e pelo próprio povo, de fins de 1895 ao correr de 1896, quando nesse ano, passou a ser usada.
Disponível em: http://www.camaraconchas.sp.gov.br/Acervo/historico/Suplemento%20Bandas/parte1.htm

(3) Aspectos Históricos de Conchas

O poético topônimo se originou da grande quantidade de moluscos, envolvidos em conchas, das mais variadas cores, que pontilhavam o riacho que corre próximo a atual cidade de Conchas a qual foi dada igual denominação. A existência dessa corrente água, na estrada de ligação entre Tietê, Botucatu e Bofete, mais parecia um convite ao viajante exausto, que não titubeava em fazer de suas margens sua pousada preferida. Alguns, até se deixavam ficar ali, construíam seus ranchos, como aconteceu a André Ferreira e a Germano Waiss (sic), que depois trouxeram suas famílias. Assim aos poucos se formou o povoado. A criação de gado, propiciada pelo trânsito de tropeiros passou a ingressar aos moradores. O comércio entrou em fase de desenvolvimento a princípio oferecendo os produtos municipais, consequência da expansão industrial que se operou.

Não podemos esquecer que o rápido desenvolvimento de Conchas, característica, aliás, inerente a grande maioria dos municípios paulistas, não esta dissociado do prolongamento da então Sorocabana Railway que desde 1888 já se estendia até Pereiras, distando de Conchas apenas 6 km.

(4) Conchas, São Paulo - Histórico

Muitos desses viajantes acabaram se fixando nas proximidades de um ribeirão- Ribeirão das Conchas, que segundo contam, tinha abundância de moluscos que deixavam suas " conchas " em sua margens.

Entre eles, André Ferreira e Germano Weiss, são considerados os fundadores da povoação que se formou no local.

O avanço da antiga ferrovia, "Sorocabana Railway", até o vizinho povoado de Pereiras em 1888, fez com que novos moradores procurassem se estabelecer.

Conchas foi elevado a Distrito de Paz em 1896, deixando de pertencer a Tietê, passou ao Município de Pereiras em 1899. Retornando a Tietê em 1902.

Disponível em: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm


 Imagens de Conchas, SP

domingo, 10 de junho de 2012

Uma professora especial (parte II)


Vovó Elisa e Renato (1963)


Minha bisavó Elisa escreveu seu Diário, ou suas memórias, durante 10 anos (de 1957 a 1967). A última anotação é de novembro de 1967. A maior ênfase é dada à família e ao “Joãozinho”, o marido, seu grande companheiro, apesar das ausências; depois aos filhos, aos netos e aos bisnetos. Sempre foi muito carinhosa com todos. Esta era a sua marca registrada.

No seu Diário existem poucas referências à história familiar (avós, migração, etc.). De acordo com um pequeno texto preparado por Claudio Fortes e publicado no Jornal Brasileiro de Cultura, de São Paulo (SP), a “Família Wey é originária da Suissa, radicada nos cantões de Zurich e de Lucerna. No ano de 1851, a mãe do sr. Germano Wey, então viúva, transferiu residência para o Brasil, e mais tarde, quando a estrada de ferro Sorocabana abriu ao tráfego a estação, hoje florescente vila de Conchas, o sr. Germano ali montou importante serraria e tornou-se prestigioso chefe político, tendo exercido cargos policiais e de eleição popular”.

O título, "Minha vida (Rabiscos)”, foi ela mesma quem deu ao Diário (ver fotografia da primeira página do Diário logo abaixo).



Antes e depois de se aposentar, ela sempre viajou muito. De carro, de ônibus e de avião. Um dia, já com mais de 75 anos de idade, veio de jipe, com meu avô Romeu, de São Paulo a Uberaba (MG). Disse que não se cansou, apesar dos 1.000 km de ida e volta.

Gostava de visitar os filhos e os netos. Ia frequentemente ao Rio de Janeiro, onde se hospedava com o filho Lúcio. Também a Santos (SP) ia com frequência, e ficava com a filha Olga e a neta Neusa. Quando interrompeu o Diário, passou o Natal e o fim de ano, até o dia 07 de janeiro de 1968, numa simples casa de madeira na praia do Perequê, no Guarujá (SP). Nessa época, o Perequê era um lindo lugar sossegado, de águas e areias limpas. A partir dos anos 1980, a poluição e a degradação ambiental e social tomaram conta do lugar.

No final do século XIX, os seus primeiros anos de vida, no interior de São Paulo, devem ter sido difíceis e, por conta dos estudos, longe dos pais. É interessante observar, ao contrário do que a sociedade brasileira valorizava na época, que seus pais deram muita importância à educação dos filhos, tendo inclusive sacrificado o convívio familiar.

No início do século XX, o Brasil e, em especial, São Paulo, passavam por intensas transformações políticas e econômicas. A industrialização avançava de modo intenso em São Paulo, capital, mudando a feição da cidade. As ferrovias, geralmente construídas com capital inglês, entravam pelo interior levando mercadorias e trazendo produtos agrícolas, principalmente o café. O eixo de desenvolvimento transferia-se do Rio de Janeiro para São Paulo, que estabelecia uma nova geopolítica nacional, incorporando ao seu raio de influência o Sul do país e o Brasil Central.

As ferrovias tiveram um papel importante na nova configuração geográfica brasileira, e a “Sorocabana Railway” (Companhia Estrada de Ferro Sorocabana), foi um destaque não só econômico, mas também social e cultural na vida dos habitantes que viviam ao longo de seu trajeto, como no caso dos moradores de Sorocaba, Botucatu, Assis, Presidente Prudente e das inúmeras cidades vizinhas, como Conchas, onde a vovó Elisa morou e onde nasceu seu primeiro filho, meu avô Romeu.

A Sorocabana foi fundada em 1870, e passou por diversas fases, com altos e baixos. A ferrovia permaneceu até 1971 sob o controle do Estado de São Paulo, quando foi incorporada à Fepasa. Em 1998, o governo Mário Covas transferiu a Fepasa para a União, que a transferiu para a RFFSA, tendo sido depois, privatizada, à Ferroban. Em 2006, a América Latina Logística comprou o grupo Brasil Ferrovias, proprietário da Ferroban.

Foi neste contexto que a família se movimentou muito, nas primeiras décadas do século XX, deslocando-se de um lado para o outro, chegando a residir em muitos municípios paulistas  ­­-- chegaram a residir, certa ocasião, por seis meses, em Aquidauana, no Mato Grosso. Tudo conforme as necessidades econômicas e os humores dos patriarcas e das circunstâncias sociais e políticas.

Com doze anos de idade, em 1895, o pai a levou, junto com o irmão, a São Paulo, para continuarem seus estudos. Vamos à segunda parte. Boa leitura!

O Diário (parte II)

Papai nos trouxe, a mim e Virgílio [a São Paulo, para continuarem os estudos]. Quando nos apresentamos na Escola Modelo da Luz, com um cartão de um padrinho político, a diretora Miss Brown (*), foi logo dizendo: não há vagas. Ficamos muito decepcionados e fomos para casa de meu tio Chico, irmão de Papai. Este, sabendo que Miss Brown era inimiga de apresentações disse a Papai: deixe as crianças comigo que eu me encarrego de matriculá-las na escola. Papai concordou e voltou a Conchas. Passados alguns dias, tio Chico disse-nos que vestíssemos umas roupinhas bem simples e nos levou à presença da diretora, Miss Brown, dizendo: essas crianças são pobrezinhas e vieram do interior, desejosas de frequentar esta escola. Ela, sem nada dizer, pegou meu mano por um braço e levou-o à sala do 5º ano, dizendo à professora: examine esse menino e veja se acompanha esta classe. Fez o mesmo comigo e deixou-me no 4º ano. Estávamos matriculados graças à tática do nosso tio.

Em casa de nosso tio Chico ficamos morando, a vida não era muito boa. Ele nos queria muito e nos tratava com carinho, mas passava o dia todo fora, pois era guarda-livros da Casa Arieta, e só regressava às seis da tarde. Minha tia não controlava a casa e os primos, vadios, empurravam todo o serviço para mim e meu irmão.

Mesmo assim, nós estudávamos e nunca perdemos o ano. Naquele tempo (1896), não havia 2ª época nos exames, portanto, quem não alcançasse média no fim do ano, estava reprovado.

Fiz o 4º e o 5º ano e passei para o primeiro do normal. Nessa ocasião, Mamãe mudou-se para São Paulo, pois Hermínia, Antonio e Germano já estavam em idade escolar.

Eu fiz o 5º ano com Dona Flávia Grassi Bonilha, ótima professora. Hermínia foi aluna de Dona Antonina de Almeida, Antonio de Dona Delfina de Lemos e Germano de Dona Inez de Castro. Era diretor nessa ocasião, o Sr. Pedro Vass. Mamãe, coitada, não poude continuar em São Paulo, porque Papai reclamava o isolamento em que vivia, numa casa enorme, em Conchas.

Ficou, então, resolvido que Mamãe regressaria com os filhos menores e eu e Virgílio continuaríamos os estudos. E assim foi. Virgílio continuou morando em casa de tio Chico e eu fui para a casa do Sr. Pedro Vass, cuja esposa era muito amiga de Mamãe.

Em 1900, Virgílio recebia o seu diploma de professor e em 1901 eu também estava formada. 

Vovó Elisa e Lúcia (filha do Romeu)

Elisa e João Gonçalves


(*) Nota sobre a educadora Miss Brown

Miss Brown surge no cenário educacional brasileiro para ser diretora da Escola Normal do Protestant College at São Paulo, criado em 1886 e que, a partir de 1897 passou a denominar-se Mackenzie College. Miss Brown havia sido diretora da Escola Normal de senhoras de Massachussets, a mesma fundada em 1848 por Horace Mann, cujas ideias inspiraram e modificaram o sistema pedagógico americano. Ao vermos a filosofia educacional de Mann, aprendemos sobre a filosofia da própria Miss Brown, que estava fundamentada nos seguintes princípios: 1) A educação deve ser universal; 2) A educação deve ser gratuita; 3) A educação deve ser administrada pelo Estado e não por organizações eclesiásticas; 4) A educação depende de professores cuidadosamente treinados; 5) A educação deve preparar tanto os homens quanto as mulheres. Tendo em vista que a reforma do sistema educacional americano teve grande influência de Pestalozzi, verifica-se essa influência também na visão de Miss Brown. O Dr. Caetano de Campos chega a afirmar que “(...) o Brasil vai ter uma verdadeira escola com ensino de Pestalozzi não falsificado” (HACK, p.108) ao referir-se à participação de Miss Brown na Escola-Modelo.

Márcia Brown teve importante participação na reforma do ensino paulista, tendo sido indicada como diretora da Escola Modelo, cujo objetivo era servir como fonte de onde sairia a orientação pedagógica adotada pelo do estado na época. Esse modelo de escola americana, trazido também por Miss Brown é que dá origem ao conhecido grupo escolar. Para além de contribuir para a reforma do sistema pedagógico no estado, Miss Brown também ajudou na organização e direção das escolas-modelo Caetano de Campos, do Carmo e da Luz(**). Como educadora protestante e calvinista, Miss Brown ensinava seus alunos sob princípios pedagógicos bem fundamentados em valores cristãos: formar o homem para ter um relacionamento com Deus e com o seu semelhante; liberdade de expressão; igualdade e muita disciplina. Miss Brown retorna aos Estados Unidos em 1896 depois de uma homenagem prestada pelo Governo de São Paulo à ilustre educadora.
(**) Escola onde Elisa e seu irmão Virgílio estudaram, em São Paulo.

Por: Luciano Azevedo
Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/94987290/Marcia-Brown