quarta-feira, 5 de setembro de 2012

O diário de uma professora (parte XIII)



Elisa Wey Muniz Barretto 
(1883 - 1970)


Chegamos ao fim... Do Diário. Gostei do resultado, da interatividade, dos comentários, das lembranças, das pessoas que se interessaram pelo Diário da vovó Elisa.

O mundo girou, como na música do Chico Buarque (Roda mundo, roda gigante/Roda moinho, roda pião/O tempo rodou num instante/Nas voltas do meu coração...)*, e agora estamos em outros tempos, em “outro mundo”, em outro século. Os pais, os irmãos, o marido, os filhos e alguns netos da Vovó Elisa “giraram” nas voltas do nosso coração. Mas estarão sempre presentes conosco. Ela também.  

* Roda Viva, de Chico Buarque
Roda Viva é uma canção do cantor e compositor brasileiro Chico Buarque de Holanda. Foi classificada em terceiro lugar no III Festival de Música Popular Brasileira, do ano de 1967.

Vamos à última parte do Diário.

O Diário (parte XIII)

Estamos no ano de 1967. Quanta coisa já se passou desde que deixei de escrever no meu diário!

Antoninho – meu irmão Antoninho, faleceu no dia 25-3-965. O coitado emagreceu muito e morreu durante a noite. Nenê encontrou-o morto, de manhã, quando ia levar-lhe o café. Foi um bom irmão, muito brincalhão e amigo de contar anedotas. Todos dizem que ele se parecia muito comigo.

Nós éramos 10 irmãos e agora estamos reduzidos a três: João, Júlio e eu. Quem irá primeiro agora?

No dia 18 de maio fui com Olga e Frankie ao Rio, onde costumo passar 4 meses.

Dia 21, Lúcio fez anos. Neyde, Marina com os respectivos maridos e filhos foram almoçar com ele.

Durante esta última estadia no Rio, passei muito bem de saúde. Somente no fim, ao fazer exame de sangue, notamos que a glicose subiu a 200 e 220. Aumentei um pouco a insulina (50)  e, no próximo exame, vamos a ver como estou.

No Rio, eu faço parte de um Club ao qual damos o nome de Club das Meninas, pois só aceitam sócias com 70 anos e mais. Fizemos uma exposição de trabalhos manuais no Teatro Municipal. Esteve linda e foi muito apreciada pelos visitantes. Eu apresentei 8 trabalhos de crochê; 1 colcha, 1 conjunto de sapatinhos e 5 proletarinhos para bebês.

Agora estou pensando o que vou fazer para apresentar no próximo ano, si até lá eu ainda pertencer a este mundo.

As reuniões do Club são muito interessantes. Cada sócia leva um prato de doces ou salgadinhos e o Club oferece o chá. Durante a reunião, as sócias cantam, declamam e dançam. Há muita camaradagem e alegria.

Vim do Rio em companhia de Selma e Neusa, no dia 10 de setembro. Vim até Santos com Neusa e Cid e regressei no dia 14, dia do aniversário da Dulce, em companhia da Olga. Vou ficar aqui na casa da Dulce até domingo, dia 24 e nesse dia Selma vem me buscar para passar uns dias em sua casa. Estivemos em casa da Jacy, de Dona Isaltina e Vera.

Hoje, 30 de novembro (1967), o apartamento da Olga está em reforma. Nós passamos o dia aqui no prédio onde vai ser o consultório da Neusa e só vamos para o apartamento dormir, pois aqui não temos cama.

Pretendemos, eu e Olga, subir amanhã (ir a São Paulo) e lá ficaremos até o Natal. Neusa irá para o Perequê com as crianças. Só ficarão em Santos o Júlio e Franco. (Fim).

 Cesta de costura da Elisa

Um dos livros do Joãozinho

Alguns livros do Joãozinho 

O final

Em 1967, Elisa interrompeu o Diário e não escreveu mais. É Olga, sua filha, que nos conta: “Mamãe parou o diário em 1967. Veio passar o Natal e ficou com Neusa no Perequê até 7/01/1968, pois o apartamento estava em fim de reforma.”

Afinal, 1968 foi o ano que não terminou...

Bem, e Elisa? Não contei ainda? Pois vovó Elisa ficou para semente, não uma, nem duas, mas várias sementes. Uma de suas preocupações, quem nos contou foi a neta Elza, é quem ficaria responsável por aguá-la. Isso já foi resolvido, muita gente hoje se encarrega desta tarefa.

E eu soube que Elisa ainda vai ao Rio de Janeiro, participa das reuniões do Club, que hoje chamaríamos de Clube da Terceira Idade, ou da “melhor idade”. Prefiro “Club das meninas”. O que acham?

Ela ainda gosta de viajar, de estar com os netos e bisnetos. Vai sempre a Santos, caminhar com os bisnetos nos jardins da praia.

Infelizmente, não voltou mais a Conchas, mas eu prometi a ela que vamos lá qualquer dia desses. Ela quer me mostrar a casa onde morou seu pai, o velho Germano Wey, e sua serraria. Será que ainda estão de pé?

Sente saudades do Joãozinho, dos filhos e dos netos que já se foram. Fazer o quê? Seguir adiante, não descuidar nunca da educação dos mais novos, zelar pelos livros do Joãozinho e, se sobrar um tempinho, datilografar o Diário, para mostrar aos netos e bisnetos e a quem mais se interessar.

Meus filhos riem quando eu falo em datilografia, mas nem eu nem a vovó Elisa iríamos imaginar, em 1968, que seu Diário fosse parar na internet no século XXI.

Se eu tiver tempo e ânimo, vou continuar escrevendo sobre as pessoas que conviveram com ela.Vou publicar algumas histórias, algumas cartas...

Vez ou outra, ela vem a Uberaba, pois não se cansa de viajar, apesar dos 1000 km ida e volta. Da última vez, me fez um sapatinho de lã. Durmo com ele nos dias frios de julho.



Minha bisavó e eu