domingo, 17 de junho de 2012

Uma professora especial (parte III)


Joãozinho e Elisa 


Quando Elisa Wey Muniz Barretto (*) nasceu, em 1883, o Brasil ainda era um império escravocrata. Em seus mais de 80 anos de vida, ela presenciou o fim da escravidão, o fim do Império, o início da República, a República Velha (da política “Café com leite” e da aristocracia rural), o Estado Novo, as duas grandes guerras mundiais, o golpe militar de 1964, as revoluções culturais que mudaram nosso modo de pensar... Ela viveu o século XX!  

Viveu, trabalhou, lecionou para crianças, teve filhos, netos e bisnetos. Teve alegrias e decepções. Acima de tudo, deixou um exemplo de carinho e bondade para as pessoas que com ela conviveram.

A pedido do neto mais velho, Sylvio, escreveu um Diário.

O Diário descreve pouco os acontecimentos políticos de seu tempo. Suas preocupações eram outras, mas suficientes para desvendarmos sua época e, como ela mesma sugeriu, através dos “rabiscos” descobrirmos uma pintura mais elaborada.

Ela não registra no seu Diário suas ideias e princípios como educadora, mas sua trajetória por inúmeras cidades paulistas, sempre como professora. O Diário Oficial do Estado de Pão Paulo, hoje digitalizado e disponível na internet, registra alguns de seus deslocamentos, algumas nomeações e outros atos. Pode-se consultar, por exemplo, as edições de 1918, de 1922, de 1923 e a de 1932.

Sua primeira regência (escola) foi em Conchas, cidade onde moravam seus pais. São várias as referências ao seu pai (Germano Wey, ou Hermann Rudolph Wey) como um dos pioneiros do município. Um historiador chega a atribuir-lhe o batismo da cidade (1). Outro historiador o menciona em artigo sobre as Bandas e conjuntos musicais de Conchas (2). A página oficial do município na internet menciona o Sr. Germano Waiss (sic) como um dos pioneiros de Conchas. O IBGE, na página “Cid@ades” cita Germano Weiss  (estava assim no original, provável erro de digitação ou desinformação) como um dos fundadores (4).

Conchas, hoje, é um município com população estimada em 16.302 habitantes (estimativa IBGE 2010). Pertence à região de Bauru, microrregião de Botucatu, e tem seus limites com os seguintes municípios: Porangaba, Bofete, Anhembi, Piracicaba, Laranjal Paulista e Pereiras. Sua economia está baseada nas atividades rurais e comerciais. Segundo o IBGE, o município tinha, em 2009, 2.474 alunos matriculados no ensino fundamental. Quantas alunas tinha a primeira classe de Elisa Wey?

Como era Conchas no início do século XX? Quantos habitantes? Quem foram as primeiras alunas de Elisa? Se alguém souber, que nos conte!

O Diário

Mamãe, cujo sonho dourado era ver os filhos formados, ficou contentíssima [com a formatura, de Virgílio, em 1900, e de Elisa, em 1901]. Ela havia prometido às crianças de Conchas que eu seria sua professora (**)

Um mês após minha formatura, fui nomeada para reger a primeira escola feminina, e Virgílio, que estava lecionando em Laranjal, conseguiu sua remoção para a primeira masculina, da mesma localidade.

Com que alegria iniciei o magistério!!! Sempre lecionei com muito prazer e consegui trabalhar 31 anos.

No dia em que me formei fiquei noiva. Casei-me aos 19 anos e casei-me por amor.

Joãozinho (***) era tudo na minha vida. Muito estudioso e com grande preparo em português, não se havia diplomado. Comprara de meu tio Pedro (irmão de mamãe), um Cartório de Paz e assim íamos vivendo.

No dia 24 de novembro de 1903, nasceu nosso primeiro filho – Romeu. Veio ao mundo muito magrinho, mas como eu tinha bom leite e abundante, criei-o ao peito e aos poucos meses passou a ser um menino robusto. Romeu foi uma criança muito boazinha e sadia. Era o nosso encanto. Praticamente foi minha cunhada Nhonhô (Elvira) quem o criou, pois ela afeiçoou-se muito a ele. Foi o nosso enlevo, a alegria do nosso lar!

Quando Romeu não havia ainda completado um ano, Joãozinho resolveu vir a São Paulo a fim de fazer o curso de Farmácia. No começo, eu não estava de acordo, pois fazia tão pouco tempo que estávamos casados e já nos íamos separar! Depois, vendo que ele muito se contrariava no Cartório, achei que devia vir. Como me doeu essa separação, a primeira! Só Deus sabe o quanto sofri!

Felizmente, fiquei morando com meus sogros e cunhados, que muito me queriam. Minha sogra foi para mim uma verdadeira mãe carinhosa.

Combinamos, eu e Joãozinho, que eu continuaria a estudar, com ele, a Língua Portuguesa. Ele mandava-me (de São Paulo) as sentenças que eu devia analisar e, na volta do Correio, eu remetia as sentenças já analisadas para que ele as corrigisse. E assim foi-se passando o tempo até que veio ao mundo o nosso segundo filho – Lúcio, três anos e meio mais moço que Romeu. Lúcio nasceu em Laranjal, no dia 21 de maio de 1907. Foi uma criança muito gorda, esperta e sadia. Aos dez meses, andou e falou.

Joãozinho, tendo se aborrecido com um dos professores da escola, passou da Farmácia para Odontologia. Ele ainda não estava formado quando Lúcio nasceu. Quatro meses depois, eu pedi minha remoção para Santa Isabel, pois a minha ambição era vir para São Paulo; porém, naquela ocasião só viriam para a Capital, as professoras que fizessem um estágio de dois anos em Comarca. Ora, Conchas não era comarca e eu já havia lecionado lá 5 anos. Esse foi o motivo da minha mudança para Santa Isabel. A minha saída de Conhas foi muito triste, pois lecionando lá 5 anos e tendo sido eu a primeira professora do lugar, tomei muita amizade às alunas e elas a mim. Foi um rio de lágrimas a minha despedida. (Continua).

(*) Em alguns documentos, e segundo sua neta Elza, o nome correto era Elisa Rosa Wagner Wey Muniz Barretto (fica o registro).

(**) Uma nota no Diário de Elisa: "A população de Conchas estava ansiosa por uma professora e sabendo da minha chegada, foi em massa, juntamente com a banda de música, à estação. Um grupo enorme de pessoas da localidade acompanhou-nos até nossa casa, onde papai fez servir uma cerveja. À noite, dançamos e ficamos conhecendo o chefe da Estação que, alguns meses depois, tornou-se noivo de minha irmã Hermínia, com quem se casou."

(***) João Gonçalves Muniz Barretto (nasceu em Mendes, RJ, em 1877, e faleceu em São Paulo, em 1956).

Localização de Conchas, SP


Notas

(1) Por que o nome CONCHAS

Já ouvi de várias pessoas que o nome da nossa cidade teria sido dado pelo Senhor Germano Wey, tropeiro vindo do Estado do Rio Grande do Sul que, constatando a grande quantidade de conchas em nosso ribeirão, nomeou este pedaço de chão com o nome do invólucro calcário dos moluscos aquáticos. 

O referido senhor, de nacionalidade suíça com pais e sogros em São Roque, filho de Francisco Wey e Ana Wey, casado com Ana Maria Wey filha de Jacob Wagner e Ana Half Wagner, foi um dos nossos pioneiros sem dúvida.

O Senhor Germano veio de Sorocaba onde se casou e teve os seguintes filhos: João nascido em Conchas no dia 20/5/1899 além de Elisa e Virgílio que em 1902 aparecem como professores de duas classes de primeiras letras, cujos alunos com bandeirolas participaram da festa feita à caravana de tieteenses que aqui veio comemorar a volta do Distrito de Paz de Conchas à jurisdição de Tietê. Se aqui chegou como tropeiro como tal não procedeu, pois se entregou à agricultura e logo em 07/01/1898 aparece como outorgante vendedor por 500$000 (quinhentos mil reis) ao Sr. Carlos Peche, de uma casa de tijolos coberta de telhas; tal casa em terreno de 40 metros de frente para a estrada para Botucatu, atual Rua Amazonas, por 57 metros de fundo,  perto da ponte sobre o Rio Chicú, atual dos Lopes, lá ainda está; Germano tinha mais terras confrontando com esse terreno e com terras de Baschoal Barone, este avô do nosso conhecido Pasqual filho de Antonio.   

Até poderia ser verdade e coubesse ao Senhor Germano o feito histórico e mérito de dar tal nome à nossa povoação, em seus primórdios, entretanto, segundo o historiador Antonio Francisco Gaspar do Instituto Histórico e Geográfico de Sorocaba, tal feito coube ao Dr. Luiz Bianchi Bertoldi; este foi o engenheiro que locou a estação nas imediações do rio Chicú, atual dos Lopes, e pelo mesmo motivo, qual seja abundância de conchas por ele constatada nas areias do referido rio, teria dado tal nome à nossa estação em 1887, chamando-a: ESTAÇÃO DAS CONCHAS. Porém um fato é certo: a incipiente povoação antes de receber a estrada de ferro ainda não tinha nome e cresceu rápida com tal melhoramento passando a se chamar Bº da Estação das Conchas; os primeiros posseiros e já bem sucedidos sitiantes da população que residia na zona rural, além de procurarem o povoado para compra de utensílios domésticos, passaram a construir casas no mesmo. O sentimento religioso já demonstrado nas tradicionais festas do Divino levou-os a solicitarem, por escrito, e prontamente atendidos pela Provisão Eclesiástica de 22/12/1890, a competente autorização do Episcopado de São Paulo para construção da Capela do Senhor Bom Jesus de Conchas; logo mais atestando o progresso da povoação criou-se o DISTRITO POLICIAL em 01/6/1892 e a seguir em 05/12/1896 o Distrito de Paz, ambos  sob a jurisdição de Tietê, como não poderia deixar de ser.

Podemos considerar o início do sentimento comunitário da pequena povoação da Estação das Conchas, aquela primeira reivindicação coletiva, reforçada mais tarde pelo pedido também por escrito, para elevação da Capela do Senhor Bom Jesus à Paróquia; este pedido foi deferido em 17/12/1899 pela Portaria Diocesana de São Paulo, pelo Cônego Tesoureiro-Mor Ezequias Galvão da Fontoura.

Não devemos esquecer que Pereiras antes desta denominação com a qual se tornou freguesia em 30/3/1876, pertencia ao município de Tatuí com o nome de Bº do Ribeirão das Conchas, sendo sua 1ª igreja reconhecida pela Diocese de São Paulo somente em 1874, por já estar de acordo com cânones eclesiásticos; era uma capela dedicada à  Nossa Senhora da Conceição do Ribeirão das Conchas. O Ribeirão das Conchas, portanto, era assim conhecido de longa data bem como por esse nome o nosso sertão. Tudo também nos levando a crer que os braganceiros para cá vieram com endereço certo: Sertões do Ribeirão das Conchas.    
          
Disponível em: http://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=7&ved=0CHQQFjAG&url=http%3A%2F%2Fwww.camaraconchas.sp.gov.br%2FAcervo%2Fhistorico%2FConchas%2F011%2520-%2520Por%2520que%2520o%2520nome%2520CONCHAS.doc&ei=r3feT4nbGIyE8QTB3o3rCg&usg=AFQjCNES5HOhGqhneD6Hk-aRsr_ZHW4dYg

(2) Bandas e conjuntos musicais da cidade de Conchas
Por Paulo Fraletti (Do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo).

As Bandas

A história das bandas musicais da cidade de Conchas, como sua própria história, está ligada à História de Pereiras, pois grande parte de seu território teve origem comum ao de Pereiras: o antigo Bairro do Ribeirão das Conchas, pertencente à Freguesia de Tatuí, com exclusão de uma pequena parte, que se ligava à Tietê.

Da mesma maneira Conchas, administrativamente, pertencera a Pereiras até 1892, quando foi criada como Distrito Policial de Tietê, e para esse município foi transferido por 7 anos (1892 à 1899), quando voltou à Pereiras, de 1899 à 1902 (3 anos), com nova passagem para Tietê, nêsse ano, agora definitivamente.

A transferência foi por obra da Chefatura de Polícia, e não da Assembléia Legislativa de São Paulo. Motivação puramente política.

Em 1887 ainda não existia banda, tanto que, no dia 21 de julho, na inauguração da Estação de Conchas dos Pereiras (Diário de Sorocaba, desse dia), segundo Sabatino Pastore e Felucho Maimone, ouviram contar que as bandas que animaram o evento, foram a Lira Pereirense, sob regência do contra-mestre José Maciel de Almeida (Mestre José) e a de Porangaba, do maestro João Gorga. A de Pereiras executara a cavatina “Santa Rosália”.

Era a primeira estação da Sorocabana, da ainda Freguesia dos Pereiras (cuja estrada não passava pela Vila, como havia sido projetada inicialmente. Conchas não existia, em 1887. Era um simples aglomerado de casas, como se nota numa foto de Pascoal Barone, na qual se vê apenas três prédios, o da Estação, o da Serraria de Germano Wey e um que não sabemos quem era o proprietário.

Com a chegada da linha férrea e a inauguração da Estação de Pereiras (em Conchas), desenvolveu-se o povoado, logo elevado a Distrito Policial, 5 anos após, em 1892, sob Tietê, como dissemos atrás, perdendo Pereiras a sua Estação, tendo a cidade que construir uma nova e pelo próprio povo, de fins de 1895 ao correr de 1896, quando nesse ano, passou a ser usada.
Disponível em: http://www.camaraconchas.sp.gov.br/Acervo/historico/Suplemento%20Bandas/parte1.htm

(3) Aspectos Históricos de Conchas

O poético topônimo se originou da grande quantidade de moluscos, envolvidos em conchas, das mais variadas cores, que pontilhavam o riacho que corre próximo a atual cidade de Conchas a qual foi dada igual denominação. A existência dessa corrente água, na estrada de ligação entre Tietê, Botucatu e Bofete, mais parecia um convite ao viajante exausto, que não titubeava em fazer de suas margens sua pousada preferida. Alguns, até se deixavam ficar ali, construíam seus ranchos, como aconteceu a André Ferreira e a Germano Waiss (sic), que depois trouxeram suas famílias. Assim aos poucos se formou o povoado. A criação de gado, propiciada pelo trânsito de tropeiros passou a ingressar aos moradores. O comércio entrou em fase de desenvolvimento a princípio oferecendo os produtos municipais, consequência da expansão industrial que se operou.

Não podemos esquecer que o rápido desenvolvimento de Conchas, característica, aliás, inerente a grande maioria dos municípios paulistas, não esta dissociado do prolongamento da então Sorocabana Railway que desde 1888 já se estendia até Pereiras, distando de Conchas apenas 6 km.

(4) Conchas, São Paulo - Histórico

Muitos desses viajantes acabaram se fixando nas proximidades de um ribeirão- Ribeirão das Conchas, que segundo contam, tinha abundância de moluscos que deixavam suas " conchas " em sua margens.

Entre eles, André Ferreira e Germano Weiss, são considerados os fundadores da povoação que se formou no local.

O avanço da antiga ferrovia, "Sorocabana Railway", até o vizinho povoado de Pereiras em 1888, fez com que novos moradores procurassem se estabelecer.

Conchas foi elevado a Distrito de Paz em 1896, deixando de pertencer a Tietê, passou ao Município de Pereiras em 1899. Retornando a Tietê em 1902.

Disponível em: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm


 Imagens de Conchas, SP

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