sábado, 21 de novembro de 2015

Crônicas no Jornal da Manhã



 


Em novembro de 2015, completa-se um ano da minha colaboração, como articulista, no Jornal da Manhã. Foram 26 crônicas publicadas, uma a cada quinze dias, aos domingos. Escrevi sobre o cotidiano, sobre educação, sobre bicicletas e sobre meio ambiente, com ênfase na Educação Ambiental.

Mais do que tudo, foi uma honra ter dividido o espaço da página dois com o excelente escritor, tão querido por todos nós, o Padre Prata.

Durante esse período, recebi alguns comentários e troquei ideias com algumas pessoas que disseram que leram e gostaram dos meus escritos. Espero não tê-los decepcionado. Tomara que continuem meus leitores!

Veja a seguir o link onde estão todas as crônicas publicadas em 2014 e 2015: http://jmonline.com.br/novo/?paginas/articulistas,675



sábado, 7 de novembro de 2015

Teatro em cena: bate-papo sobre teatro em Uberaba nos anos 1970




O teatro é importante? Serve para quê? Numa entrevista recente a uma revista, um dos maiores diretores do teatro brasileiro, Antunes Filho, disse que “o teatro é formador de consciências”. Noutro trecho da mesma entrevista, ele complementa: “o teatro é feito para o outro, é alteridade, é ética. Eu não posso desvincular o teatro da sociedade e do homem, não posso fazer uma coisa lá para as nuvens e que não tenha interesse humano e social.” (Caros Amigos, outubro de 2011). Penso que essas palavras têm um significado muito importante para quem participou de alguma atividade teatral nos anos 1960 e 1970, seja no palco ou na plateia. A partir disso, realizar alguma atividade de reflexão sobre o tema era uma necessidade afetiva e cultural para mim.

No dia 31 de outubro, uma agradável manhã do último sábado de outubro de 2015, um grupo seleto de pessoas que aprecia o teatro reuniu-se na Livraria Alternativa para um bate-papo em torno de algumas vivências e experiências acontecidas há quase 50 anos. Só que os assuntos não se resumiram apenas ao passado.

O convite partiu da Thaís Helena Syllos Cólus e do Emílio Maciel, ambos incentivadores do teatro na cidade. Ela é a proprietária da Livraria Alternativa e ele é diretor da Companhia Rogê de Teatro. A programação envolveu uma mostra de folhetos, panfletos, filipetas e programas de peças de teatro das décadas de 1960 e 1970, um debate aberto com os presentes e uma fala sobre um pouco da minha própria vivência em teatro, em especial no Teatro Experimental de Uberaba (TEU), na primeira metade dos anos 1970.

Conversamos sobre as peças que montamos, sobre o público, sobre os atores da época, sobre espetáculos de outros grupos teatrais que vieram a Uberaba, sobre as condições que possibilitaram a existência de várias iniciativas culturais naquele momento chave da vida nacional, sobre as dificuldades, sobre a censura, as circunstâncias e os significados que cercavam o “fazer teatro” nesse período. Diversas análises sobre o contexto da época e inúmeras comparações com a realidade atual concentraram boa parte das atenções e das falas de quem estava presente. Foi um ótimo debate, uma excelente troca de ideias, revigorante e estimulante.

Passaram pela livraria diversas pessoas, representantes de várias gerações que viveram o teatro em Uberaba, desde os anos 1960 até hoje. Que os organizadores do evento se sintam estimulados a programar outras atividades semelhantes. Aqueles que gostam de teatro, que apreciam a arte e valorizam a cultura local agradecem porque, afinal o teatro serve, entre outras coisas, para que as pessoas dialoguem com a vida!


















sexta-feira, 30 de outubro de 2015

No caminho, com o teatro




Uma promoção da Livraria Alternativa

Terceira cena: no caminho, com o teatro a tiracolo

O ano de 1970 começou numa quinta-feira. Que informação importante! Neste ano, iniciou-se a "Era Unix". Não sabe o que é? É o marco zero do sistema de calendário usado pelo sistema operacional UNIX. Hum... Consulte a Wikipédia.

É que minha relação “séria” com o teatro começou em 1970. Mas, deixa pra lá! Pois, em 1970, o Brasil vivia uma ditadura, embora poucos ousassem dizer esse nome feio. Acreditem, muitos chamavam de “A Revolução”. O plantão da presidência era exercido pelo General Emílio Garrastazu Médici (1905 — 1985). As enciclopédias dizem que foi o 28º Presidente do Brasil, que governou entre 30 de outubro de 1969 e 15 de março de 1974, mas, na verdade, foi o 3º escalado para dar expediente durante a ditadura militar do país, sem falar na Junta Militar, que deu as ordens entre 31/08/1969 e 30/10/1969.

Ao longo do governo Médici, nos chamados Anos de Chumbo, referência ao material de que são feitas as balas de fuzis, a repressão da ditadura militar atingiu seu auge. Poucas eram as atividades políticas toleradas. Não sabíamos bem os porquês, mas muitas coisas não podiam ser ditas, comentadas. Vivíamos o medo e a censura, principalmente às artes e à imprensa. As manifestações contrárias às orientações do governo eram proibidas e reprimidas. No colégio, no clube, nos cinemas e nos barzinhos que frequentávamos, nos passeios de bicicleta, pouca gente falava disso. Muitos meninos e meninas da classe média, com idade entre 10 e 15 anos, viviam numa espécie de ilha da fantasia, encantados com a televisão, o futebol, os bailinhos, chamados de “mingau”, a “Jovem Guarda” (argh!), e o cinema, em especial com os filmes de faroeste, e os Beatles.

Se alguém observasse bem de perto, enxergaria um período marcado por diversos tipos de violências. Nunca resolvidas, até hoje.

Neste ano, para quem gosta de estatísticas, ocorreram mais de 1200 casos de tortura e foram mortas mais de 30 pessoas, todas ligadas às chamadas organizações subversivas. Ser contra as orientações do governo era uma atividade de alto risco. Não queiram saber detalhes das execuções e das torturas, isso envergonha um país, um povo, uma geração.

Quando chegamos, em 1970, muita coisa já estava pronta no mundo. O rock, por exemplo, já estava a pleno vapor. Beatles (1960), Rolling Stones (1962) e Led Zepelin (1968), já estavam por aí fazendo um som da pesada. Embora eu não tivesse nem 13 anos, pensei seriamente em pedir permissão aos meus pais para ir ao Festival de Woodstock (1969). Imaginando que eles não deixariam, nem pedi. Pelo menos, apesar de ter enfrentado uma terrível resistência, meu cabelo comprido era de dar inveja ao John Lennon. Numa última tentativa de me inserir de cabeça nos anos 1970, pedi aos meus pais para assistir ao musical Hair. E esse meu pedido foi negado. Se tivessem permitido, os fiscais da censura não me teriam deixado passar nem perto. Só bem mais tarde, já nos anos 2000, é que pude ver este musical, ícone do teatro mundial. Se o Caetano conheceu uma tigresa que trabalhou no Hair, minha esposa também trabalhou no Hair. Foi nos anos 2000, numa montagem atual. Completamente emocionada, ela não resistiu ao chamado mágico vindo do palco e foi dançar com o elenco na cena final. Daí eu poder dizer, junto com o Caetano, que eu também tenho uma namorada que trabalhou no Hair. Que chique não?

Mas a vida, em 1970, não se resumia aos festivais, como disse o Geraldo Vandré no Festival de Música Popular Brasileira, em 1968. Os garotos, além de admirarem Pelé, Jairzinho, Rivelino, Tostão e Gerson, também liam Opinião, Pasquim, Movimento, Bondinho e Realidade. Admiravam Leila Diniz, Jane Fonda, Mia Farrow, Jessica Lange... E choraram a morte de Janis Joplin (1943 – 1970) e a de Jimi Hendrix (1942 – 1970).

Nem nos preocupavam coisas como a construção da Rodovia Transamazônica, de Itaipu, da Ponte Rio-Niterói, a morte de operários ou os sequestros dos embaixadores do Japão, da Alemanha e da Suíça. Alguém escondia isso tudo de nós, que, em contrapartida, tínhamos de decorar os nomes dos ministros do Médici, e ai de nós se errássemos um nome sequer! A consciência veio depois, como na música do Belchior: Não quero lhe falar meu grande amor, de coisas que aprendi nos discos. Quero lhe contar como eu vivi e tudo o que aconteceu comigo. Viver é melhor que sonhar, e eu sei que o amor é uma coisa boa, mas também sei que qualquer canto é menor do que a vida de qualquer pessoa. Em todo caso, o Brasil era “um país que vai pra frente”.

Por trás, escondidos dos olhares ingênuos, dos olhares inúteis, dos olhares cúmplices, nos porões da ditadura, no Destacamento de Operações e de Informações (DOI), nos Centros de Operações de Defesa Interna (Codi), no Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica (Cisa), no Centro de Informações do Exército (CIE) e no Centro de Informações da Marinha (Cenimar), estavam os presos políticos, para morrer ou mofar. “Brasil, ame-o ou deixe-o”, e a gente completava: "o último que sair apague a luz".

Pena que a censura prévia de livros, periódicos e outras expressões artísticas foi oficializada pelo governo nesse mesmo ano. O Decreto-Lei nº 1.077, de 21 de janeiro de 1970, instituiu a censura prévia. Funcionava assim: os censores chegavam, instalavam-se e decidiam o que podia, ou não, ser publicado, visto, ouvido. Outra modalidade era enviar a edição antecipadamente, com o que pretendiam publicar, para a Divisão de Censura do Departamento de Polícia Federal, em Brasília. Muito comum era a autocensura, ou seja, cortar o que fosse imaginando o que se passava pela cabeça tosca dos censores e o que não deixariam passar. E tem gente que ainda tem saudades desta época. Eu hein! Quero pensar por mim mesmo, não quero censores dizendo o que eu, meus filhos, meus amigos podem ver ou não. Sai fora retrocesso!

Foi justamente nessa época que nós começamos a fazer teatro. Período estranho, não? Tanta coisa acontecendo, nós entrando na adolescência, o país entrando no buraco, gente sendo torturada, a arte censurada... Só a economia ia bem, mas o Delfim recusava-se a “dividir o bolo”.

Acontece que queríamos dividir o bolo e mudar o mundo! E o teatro foi o caminho que se abriu para nós naquele momento fecundo.

Para concluir, um trecho de um belo poema do teatrólogo alemão Bertold Brecht:

Eu vim para a cidade no tempo da desordem,
Quando a fome reinava.
Eu vim para o convívio dos homens no tempo da revolta
E me revoltei ao lado deles
Assim se passou o tempo
Que me foi dado viver sobre a terra.
Eu comi o meu pão no meio das batalhas,
Para dormir eu me deitei entre os assassinos.
Fiz amor sem muita atenção
E não tive paciência com a natureza.
Assim se passou o tempo
Que me foi dado viver sobre a terra.

Vocês, que vão emergir das ondas
em que nós perecemos,
Pensem,
Quando falarem das nossas fraquezas,
Nos tempos sem sol
De que tiveram a sorte de escapar.
Nós existíamos através das lutas de classes,
Mudando mais seguido de país do que de sapatos, desesperados,
Quando só havia injustiça e não havia revolta.

Nós sabemos:
O ódio contra a baixeza
Também endurece o rosto!
A cólera contra a injustiça
Faz a voz ficar rouca.
Infelizmente, nós,
Que queríamos preparar o terreno para a amizade,
Não pudemos ser, nós mesmos, bons amigos.
Mas vocês, quando chegar o tempo
Em que o Homem seja amigo do Homem,
Pensem em nós
Com um pouco de compreensão.
(Trecho do poema “Aos que virão depois de nós”, de Bertold Brecht. Extraído do livro “Brecht, vida e obra” de Fernando Peixoto).

"Pensem em nós com um pouco de compreensão" 



As três fotografias acima são do folheto do musical Hair, que estreou no Brasil em outubro de 1969. No elenco, o ator uberabense, Benê Silva e o ator Luiz Fernando Resende, de Araguari, MG.
 Woodstock

 Janis Joplin
 Jimi Hendrix

Amanhã, 31 de outubro, a partir das 10h, estarei na Livraria Alternativa (Rua Major Eustáquio, 500), conversando sobre o teatro dos anos 1970 em Uberaba. Venham tomar um café, conversar, relembrar.