domingo, 25 de agosto de 2019

Educação


É pra levar a sério?

Renato Muniz Barretto de Carvalho

Algumas pessoas gostam de atribuir à educação o poder de resolver todos os problemas. Se não foram resolvidos é porque faltou educação. Louvável! Será? Em qualquer discursinho de fim de semana, em solenidades chinfrins de inauguração de prolongamento de rua ou festinhas de aniversário, sempre há quem exalte a educação como salvação do mundo. Em eventos políticos, casamentos, batizados ou velórios, é costume ouvir observações genéricas: “educação é arma poderosa”, “educação é tudo”, “só a educação para acabar com a corrupção” e coisas semelhantes. A sensação que fica é a de que a educação conserta tudo. Se alguém está com dor de barriga: educação; se alguém foi mordido por um cachorro louco: educação; pobreza: educação; lixo nas ruas: educação; salários baixos: educação… E assim por diante. Numa rodinha de amigos, alguns acham chique dar o veredito: “o povo não tem educação!”. Todo mundo fala de educação, enche a boca e cospe regras. Já viram algum candidato a cargo político não falar que sua prioridade vai ser a educação? Não existe!

Então, resolvi sair por aí pra ver se descobria onde estava a educação. Não foi muito animador. Nas estradas e nas ruas, encontrei placas assim: “não danifique a sinalização”, “não jogue lixo no chão”, etc. Parece “pedagogia da negação”: “não pode…”, “não faça…”. Isso é educação? Vi grande quantidade de câmeras, de radares, de placas com ameaças e advertências. Vi muitas placas furadas por tiros. Será a “pedagogia da bala”? São placas ou são alvos? Vi sujeira, acidentes, queimadas, desrespeito às leis, vi multas, repressão, mas não encontrei ações concretas de educação. Será que estão confundindo educação com repressão?

Nas cidades, vi muito lixo nas ruas, vi lixões — e eu acreditava que não existissem mais —, vi muita poluição, me deparei com disputas idiotas para saber quem produzia o som mais alto, vi praças deterioradas, prédios públicos caindo aos pedaços, crianças que deveriam estar nas escolas estavam nas ruas. Percebi que mais cortam árvores do que plantam, e não cuidam das que existem. Encontrei mais farmácias do que livrarias. Será que o conceito de educação mudou e eu é que não compreendi?

Parei numa cidade e vi crianças trabalhando, vi mulheres assassinadas, motoristas bêbados, teatros fechados, poucas bibliotecas. Ouvi pessoas emitindo juízos apressados sobre feminismo, homofobia, sexualidade, ciência, arte e cultura com base em preconceitos, em simplificações inacreditáveis. Constatei salários baixos, desvalorização da profissão docente e professores tristes. Muitos falavam de educação como quem comenta a escalação do time no jogo de domingo.

Cheguei a algumas conclusões, mas ainda tenho de procurar bastante; não consegui todas as respostas. Para várias pessoas educação é algo dos outros, é atividade para crianças, não é para adultos, mas gostam de emitir opiniões desencontradas. Tem muito palpite, misturam religião com educação, confundem com instrução, acham que é mercadoria… Afinal, é pra levar a sério?

Revisão: Revise Reveja (Quer saber mais? Clique aqui).

Publicado no Jornal da Manhã, em 25-08-2019 (Link).

sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Beijar na boca não pode


Estradas, livros digitais, solidão e sexualidade no novo livro de Renato Muniz

Beijar na boca não pode é o título do intrigante romance, com fragmentos de literatura policial.

Renato Muniz é mineiro de Uberaba, professor universitário, escritor e geógrafo. Este é seu primeiro romance. O autor tem se dedicado aos gêneros curtos: crônica e conto, desde a década de 1980. Renato já nos brindou com os livros: Os bichos são gente boa (2008), A máquina de ensinar (2010) e Quando a saudade é o tempero (2018), todos com forte influência da cultura e das paisagens do Cerrado.

Neste livro, um gestor de RH de uma editora paulistana tem de se deslocar ao Nordeste, mais precisamente a Aracaju, para resolver assuntos relacionados ao assassinato de um funcionário da empresa. As circunstâncias da morte são misteriosas, o que o leva a refazer os passos do colega em sua trajetória por cidades de Minas e do Nordeste. Inicialmente machista e homofóbico, o gestor de RH busca respostas que envolvem questões de comportamento, discriminação e violência. O ponto central de suas indagações são as relações que o colega manteve com uma travesti, também assassinada. 

Tenso e ágil, o romance prende a atenção do leitor do começo ao fim.

Beijar na boca não pode
De Renato Muniz B. Carvalho
Romance, 176 páginas, Adelante (Selo da Editora Gulliver).
R$ 45,00
À venda no site da editora: aqui.


segunda-feira, 19 de agosto de 2019

Poesia


Poesia: pra quê?

Renato Muniz Barretto de Carvalho

Para muita gente boa, poesia é o ápice da criação literária. Dizem que um bom poema é capaz de atingir o fundo da alma ou o ponto mais secreto do cérebro; pode fazer chorar, sorrir e estimular o raciocínio do mais insensível ser humano. Tenho muitos conhecidos que guardam, ao lado de fotografias de pessoas queridas, um poeminha predileto. Quem nunca guardou uma poesia escondida na dobra da carteira ou no fundo da bolsa que atire a primeira pedra! Aliás, “tinha uma pedra no meio do caminho…”. Para outros, e ainda bem que são poucos, poesia é algo inútil. Eu fico com os primeiros.

O João, por exemplo, é um amigo que está entre os primeiros: ele adora poesias. Quanto aos que não gostam, prefiro nem comentar nem citar nomes. Ninguém é obrigado a gostar, mas o João é professor de História e me contou que tem um acervo de mais de cem poesias para uso em suas aulas. Todo início de aula, ele pede a um aluno que vá à frente da sala e declame um poema. Os alunos são encarregados de trazerem a poesia. Se não trouxerem, e isso não é uma coisa que o aluno é forçado a fazer, o João já tem a poesia e saca na hora, do próprio bolso. Ele diz que poema tem de estar pronto pra usar, de preferência num lugar acessível. Quando menos se espera, vamos precisar de poesia; portanto, é gênero de primeira necessidade.

O João me disse que nenhum aluno é coagido a se tornar poeta, muito menos crítico literário — ele apenas mostra a importância dos textos literários. Gostar é outra coisa, deve ser espontâneo, vem com o tempo, mas devemos garantir o acesso à literatura, senão fica difícil apreciar e entender.

Tem poesia de tudo quanto é jeito, estilo, formato, tamanho e mil coisas que nem sei se eu saberia mencionar. Tem pra tudo quanto é gosto: antigas, modernas, as do futuro, as que todo mundo decora, as que pouca gente conhece e as que nem existem ainda, as que virão — porque poesia é uma coisa que nunca vai acabar. Tem poesia com rima, sem rima, tem poema visual, com temática política, amorosa, religiosa, sensual, histórica, etc. Basta escolher! Tem na internet, inclusive dos maiores poetas, os atuais e os antigos. Tem do Camões, da Cecília Meireles, do Fernando Pessoa, da Hilda Hilst, do Olavo Bilac, do Maiakovski, da Ana Cristina Cesar, do Drummond, da Florbela Espanca, do Manuel Bandeira, da Cora Coralina e de poetas que estão começando agora.

É pena, mas tem gente que não sabe nada disso! Há aqueles que acham poesia algo muito estranho, subversivo, enigmas de outro mundo, um desassossego, e aqueles que não querem saber dela em lugar algum. Ainda bem que tem os que colocam poesias nos postes, nos muros, nos ônibus, na internet, no metrô, nas praças e até publicam livros. Vou te revelar um segredo: sem poesia não haverá futuro.

Revisão: Hugo Maciel (Veja aqui)




sexta-feira, 16 de agosto de 2019

Desmatamento na Amazônia


Desmatamento da Amazônia: uma questão crítica

Renato Muniz Barretto de Carvalho

Só se fala nisso! Aqui, no exterior, nos jornais, nas TVs e nos gabinetes. Se não chegou aos botecos, já está nas salas de aula, nos laboratórios e nos encontros científicos. Não é um assunto irrelevante, não é algo a ser deixado de lado. Interessa a alunos, professores, pesquisadores e às pessoas comuns, como eu e você.

Assim como a caça às baleias, o destino dos ursos-polares, a quantidade imensa e insensata de plásticos nos oceanos, a falta de saneamento básico — que afeta principalmente as periferias das grandes cidades — e a poluição do ar, entre outros assuntos correlatos, o desmatamento da Amazônia preocupa cidadãos de todo o mundo.

Para quem não sabe, a área da Amazônia é de 7 milhões de quilômetros quadrados, território em grande parte coberto pela floresta tropical. Compreende nove países: Brasil, com 60% da floresta, Peru, Colômbia, Venezuela, Equador, Bolívia, Guiana, Suriname e França (Guiana Francesa). É o maior bioma brasileiro. Só esses dados já seriam suficientes para entender que a degradação socioambiental da Amazônia é um drama internacional. Além disso, a floresta, as águas, os animais e as populações tradicionais da Amazônia têm histórias interconectadas que envolvem situações diversas, que ultrapassam fronteiras nacionais e remetem ao passado da humanidade. Para citar um único exemplo: basta pensar nos efeitos sobre o clima de vastas extensões da América do Sul caso mudanças drásticas aconteçam na floresta.

É óbvio que o desmatamento da Amazônia interfere nas relações internacionais, afeta a biodiversidade, atrai atenção de cientistas, de jornalistas e de pessoas cientes das consequências negativas advindas da ausência da floresta. O desmatamento envolve situações complexas cuja solução não pode ficar à mercê de atitudes irresponsáveis, maluquices e ocultação de dados, sonegação de informações e de discussão ampla. É uma questão que exige atenção de todos os que se importam com a vida no planeta!

Para ajudar aqueles que se interessam pelo assunto a refletirem sobre a questão e se informarem, indico a leitura do material elaborado pelo Nexo Jornal sobre o desmatamento da Amazônia (clique aqui).

Vale a pena consultar os dados do Imazon sobre o assunto. “O Imazon é um instituto de pesquisa cuja missão é promover conservação e desenvolvimento sustentável na Amazônia. O Instituto foi fundado em 1990, e sua sede fica em Belém, no Pará. Em 28 anos de existência, o Imazon publicou 648 trabalhos técnicos, dos quais quase um terço foram veiculados como artigos em revistas científicas internacionais.” Em especial, recomendo consultar o Boletim do Desmatamento da Amazônia Legal (edição de julho de 2019, disponível aqui).

Seria bom examinarem também os dados do próprio INPE, disponíveis aqui.

O Instituto Socioambiental também se dedicou ao assunto, trazendo dados atualizados de uma nova plataforma. Esses dados estão disponíveis aqui.

Querem saber mais? Centenas de notícias foram veiculadas nos meses de julho e agosto de 2019 sobre o desmatamento na Amazônia, façam uma pesquisa básica na Internet e vão encontrar muita coisa. Mas é preciso “separar o joio do trigo”, o tema é polêmico, tem muita notícia falsa e muita opinião desencontrada. É fundamental considerar a produção científica sobre o assunto.

Tem muita gente boa pensando sobre tudo isso: cientistas, jornalistas, indígenas, agricultores etc., todos preocupados com a floresta e seu futuro. Para encerrar esta postagem, aconselho assistirem ao excelente vídeo “O que está acontecendo na Amazônia”, da turma do Meteoro, disponível aqui.

Boa pesquisa! Boa leitura!

 Algumas informações básicas sobre a Amazônia

Na Amazônia existe a maior floresta tropical do mundo.

O território brasileiro está localizado na América do Sul, apresenta extensão territorial de 8.514.876 Km² e é o quinto maior país do planeta, só é menor que os territórios da Rússia, Canadá, China e Estados Unidos, respectivamente.

É composto por 26 estados e 1 Distrito Federal, divididos em cinco regiões. As regiões e os respectivos estados integrantes são:
Região Sul: Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina;
Região Sudeste: Espírito Santo, Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro;
Região Centro-Oeste: Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal;
Região Nordeste: Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe.
Região Norte: Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.

Área dos estados da Região Norte:
Acre:               164.123,040  
Amapá:            142.828,521
Amazonas:       1.559.159,148 (18,31% do território nacional)
Pará:                1.247.954,666 (14,65% do território nacional)
Rondônia:        237.590,547
Roraima:          224.300,506
Tocantins:        277.720,520

Região Norte: 3.853.676,948 (45,2% do território nacional)

Mato Grosso: 903 366,192 (10,61% do território nacional, aprox.. metade na Amazônia)

A Amazônia Legal é uma área que engloba nove estados do Brasil pertencentes à bacia Amazônica e à área de ocorrência das vegetações amazônicas.

Nela, vivem em torno de 23 milhões de pessoas, segundo o censo 2010, distribuídas em 775 municípios, nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins (98% da área do estado), Maranhão (79%) e Goiás (0,8%).

A atual área de abrangência da Amazônia Legal corresponde à totalidade dos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins e parte do estado do Maranhão (a oeste do meridiano de 44º de longitude oeste), perfazendo uma superfície de aproximadamente 5.217.423 quilômetros quadrados correspondente a cerca de 61% do território brasileiro.

A Amazônia é o pulmão do mundo?
Não. Não é correto fazer esta afirmação, o que não tira a importância da floresta. Segundo pesquisas sobre o assunto, apesar da “alta produção de oxigênio no processo de fotossíntese, árvores adultas consomem, na sua respiração, praticamente a mesma quantidade de oxigênio produzida na fotossíntese. Por isso, o saldo de produção de oxigênio gerado pela floresta é pequeno.” (Folha de São Paulo, 23/08/2019).

Pouco mais da metade do oxigênio produzido no planeta é gerado por algas marinhas (55%). O “pulmão do mundo”, portanto, está nos oceanos.

A matéria a seguir, com pequenas supressões e grifos do blog, é do jornal Folha de São Paulo:

A destruição da Amazônia afeta o resto do mundo?
Verdade. Embora não seja o pulmão do mundo, a Amazônia tem um papel fundamental na regulação do clima global, junto a outras grandes florestas tropicais.

Com árvores de folhas perenes, as florestas tropicais funcionam como estoques de carbono (que compõe caules, folhas e raízes das árvores). As queimadas lançam o carbono na atmosfera, ampliando o efeito-estufa, que causa o fenômeno do aquecimento global.

Outro processo que acontece massivamente na Amazônia é a evapotranspiração, feita pelas folhas das árvores para liberar o excesso de água captado pelas raízes. De microgotículas em microgotículas, cada uma das árvores da Amazônia lançam na atmosfera de trezentos a mil litros de água por dia.

O resultado é a geração de chuvas para o Centro-Oeste, Sudeste e Sul brasileiros, em um fenômeno que ficou conhecido como “rios voadores”, que influenciam também as correntes dos oceanos.

A Amazônia é a maior floresta do mundo?
A maior floresta do mundo fica na Rússia. É a floresta boreal, também chamada de Taiga, e tem extensão de 12 milhões de km².

A Panamazônia, que compreende o território brasileiro e de mais oito países na região, tem 8,47 milhões de km2. O território amazônico no Brasil é de 5,5 milhões de km². Entre as florestas dos trópicos, a Amazônica vence em território. Portanto, é reconhecida como a maior floresta tropical do mundo.

Qual é o impacto socioambiental atual sobre a Amazônia?
As principais pressões de desmatamento na Amazônia brasileira acontecem por atividades de grilagem de terras, que são desmatadas para extração de madeira e ocupadas com pastagens de gado. Portanto, o consumo de produtos madeireiros e também o consumo de carne pode ter relação direta com o desmatamento.

Nos últimos anos, diversas iniciativas do setor privado passaram a rastrear e comunicar a origem dos produtos, mas as cadeias produtivas da Amazônia ainda enfrentam dificuldades para garantir a certificação de origem, pouco acessível ao consumidor final.

O Brasil é o país com mais áreas protegidas?
Segundo dados do Banco Mundial, o Brasil ocupa a posição 52 no ranking de países com mais áreas protegidas, com cerca de 30% do território.

Vizinhos amazônicos como Peru, Equador, Colômbia e Bolívia têm mais de 40% de seus territórios protegidos, enquanto países desenvolvidos como Reino Unido e Japão têm 29% .

Segundo levantamento do Observatório do Clima, “a Rússia, apesar de ter formalmente menos áreas de conservação que o Brasil, possui 48% do seu território coberto por florestas – uma área verde quase do tamanho do Brasil. Quando somadas as áreas de estepes (campos naturais) e alagados, a cobertura nativa chega a 70% do país”.

Amazônia sempre teve queimadas, mas o mundo só se preocupa agora?
Mentira. O fenômeno que faz o mundo voltar as atenções para a Amazônia agora não acontecia há pelo menos 15 anos no Brasil. Segundo cientista da Nasa, cenário semelhante foi visto de 2002 a 2004, quando desmate era superior a 20 mil km² por ano. Após um pico de mais de 25 mil km² em 2004, as taxas de desmatamento na região diminuíram gradativamente, chegando a menos de 5 mil km² em 2012, conforme os dados do Inpe. Em 2018, o desmatamento foi de 7.902 km².

A taxa de 2019 ainda será confirmada pelo Inpe através do sistema Prodes, mas o agregado dos alertas do sistema Deter indicam alta de 40%.

Todas as queimadas visam ao desmate?
Apesar de ser considerado um método ultrapassado, a queimada ainda é usada para abrir terreno para novos plantios ou para pastagem. Também se elimina bagaço dos cultivos pela queima. Incêndios naturais podem tomar grandes proporções em épocas de seca, quando o fogo se alastra mais facilmente. Também há casos de incêndios criminosos provocados em conflitos por posse de terra — as disputas são frequentes na Amazônia. Entretanto, as queimadas atuais têm relação direta com desmatamento, conforme dados de satélites da Nasa e do Inpe que mostram focos de incêndio nas mesmas áreas onde ocorre desmatamento.


Informações retiradas da Wikipédia e da Folha de São Paulo (aqui).