quarta-feira, 4 de março de 2015
As crônicas no Jornal da Manhã
Em
outubro de 2014, fui eleito para ocupar a Cadeira número um da Academia de
Letras do Triângulo Mineiro (ALTM). Em seguida, a jornalista Lídia Prata,
diretora do Jornal da Manhã, e também uma acadêmica, me convidou para escrever
quinzenalmente no JM. Aceitei de bom grado e, desde novembro de 2014, tenho
publicado regularmente no Jornal, sempre aos domingos.
Para
quem não teve oportunidade de ler na época em que foram publicadas, vou colocar
neste Blog as crônicas que escrevi. Elas também podem ser lidas no site do
próprio Jornal (http://jmonline.com.br/novo/?paginas/articulistas,675).
Espero que gostem.
Eis a primeira desta leva:
Os vários apelidos da chuva
Renato Muniz Barretto de Carvalho
Ao longo da
minha vida, eu aprendi, principalmente com o povo simples da roça, que a chuva
tem vários apelidos e acessórios. É o mesmo que dizer que, quase sempre, ela
vem acompanhada de diversos adjetivos. Não é uma questão de nomenclatura
apenas, mas uma questão de ser, de essência. Seus nomes de batismo dependem de
suas características, de sua intensidade, de sua duração e de muito mais.
Não há como
não prestar atenção na chuva. Raramente ela cai sem que alguém não perceba.
Quando ela dá o ar da graça, o ambiente se modifica, fica mais úmido, o cheiro
muda – é o famoso cheirinho de terra molhada! –, ela faz barulho, às vezes
provoca estrondos e rugidos. Num lugar fechado dá para perceber que ela veio
por causa do som das gotas batendo no telhado ou nas janelas. Só se o lugar for
muito fechado, sem vidraças, para não perceber. É preciso reconhecer, com
tristeza, que lugares assim existem, onde quem está dentro não tem ideia do que
se passa fora. Essas pessoas, quando saem à rua depois da chuva, logo percebem
que choveu, seja pelo ar mais limpo, seja pelas poças d’água que permanecem no
chão. Quando a chuva vem acompanhada de raios e trovões, fica difícil não
perceber sua presença.
Se tudo correr
bem, e a chuva vem devagar, suave, ela se chama chuva mansa, ou,
carinhosamente, chuvinha mansa. Pode durar bastante, ou por breves instantes.
Essa chuva geralmente agrada, satisfaz até os rabugentos.
A chuva pode
mudar de humor e vir na forma de chuva brava, quase uma tempestade. A culpa não
é dela, mas é como se ficasse mal humorada, ranzinza, suas águas desagregam
partículas de solo, desmoronam barrancos, derrubam casas, enchem as várzeas.
Quando ela
fica instável, já chega arrebentando tudo, se enfurece, vem acompanhada de
muitos relâmpagos, de vento forte, é porque ela virou um chuvão. É chuva para
se temer, porque chega no rastro de muita poeira, com folhas caídas, porque
inunda as ruas, derruba árvores, inverte guarda-chuvas, levanta a saia das moças
e molha a barra das calças compridas.
A chuva que eu
mais gosto é a chuva criadeira. Esse nome eu ouvia o meu avô falar. E ele
falava com gosto! É a chuvinha que cai devagar, sem fazer estragos, penetra no
solo, enche os rios sem arrebentar as margens. Ela cai no lombo do gado e os
animais ficam quietinhos, parece até que estão dormindo. O tempo esfria e o
melhor a fazer é se achegar a um fogão de lenha, sentar num banquinho, e ficar
só olhando pela porta. Ou convidar o amor para ficarem bem juntinhos. Ou então
ir pra varanda, pegar um bom livro e ouvir a água cair, fazendo massagem no
cérebro. Chove chuva!
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