Renato Muniz Barretto de
A
Algumas
O Afonso
No
Se a pobre árvore morrer, pode ser que não seja
Literatura, educação ambiental, viagens, política e outras impertinências. Bate-papo com e sem compromisso; a escolha é sua!
Renato Muniz Barretto de
A
Algumas
O Afonso
No
Se a pobre árvore morrer, pode ser que não seja
Renato Muniz Barretto de Carvalho
Antes de
As sociedades primitivas valiam-se de uma intensa oralidade. Estudos de antropologia dizem que a tradição passava de pai para filho através de longos rituais onde ouvir e contar histórias estava no centro da formação e manutenção da identidade do grupo, significando sua própria continuidade enquanto organismo social ou etnia. Inúmeros relatos sobre primeiros contatos entre pessoas que desconhecem a língua do outro registram intensas tentativas de diálogo, valendo toda forma de expressão, de gestos a falas intermináveis, talvez em busca de palavras ou sons semelhantes, capazes de estabelecer uma ponte entre os diferentes.
A
Nunca se produziu
E a questão ecológica? E as árvores abatidas para produzir o papel? Não são os livros os culpados pelo seu desaparecimento. São as queimadas criminosas praticadas desde os tempos coloniais e que permanecem, atualmente relacionadas a um setor arcaico do agronegócio, moderno na utilização de insumos e nas quantidades produzidas, ultrapassado quando se pensa nas relações humanas, na permanência do trabalho escravo, na concentração de terras e na relação predatória com o meio ambiente. Nas queimadas que avançam sobre a Amazônia, sobre a Mata Atlântica e o Cerrado abrindo caminho para a soja, a pecuária e, no seu encalço, outras culturas consumidoras de agrotóxicos, água e terras férteis.
A culpa é de políticas que sempre beneficiaram uns poucos em detrimento da maioria, é da ausência de políticas públicas discutidas amplamente e voltadas à preservação, não apenas como valor em si, mas também como elemento vinculado à qualidade de vida.
A culpa é de uma visão que ainda vê na burocracia um instrumento de controle e opressão social, que valoriza boletos bancários, cópias autenticadas, talonários de multas, segundas vias, certidões e papéis sem valor algum para a cultura e o bem-estar humanos. Livros, ao contrário de papéis inúteis e de outros instrumentos de poder de um estado ainda muito autoritário e a serviço de grupos minoritários, podem, ao lado da educação ambiental, ajudar a combater a poluição e o desmatamento, a construir estilos de vida mais saudáveis.
Renato Muniz Barretto de Carvalho
Certa vez, na faculdade, apareceu um cara engraçado. Não era o tipo físico, e o fulano nem fazia gracinhas ou contava piadas. O fato é que ele ficava próximo da porta da sala de aula, do lado de fora, escutando minhas aulas. Não percebi nas primeiras vezes, e custei a entender o que realmente acontecia. Cheguei a convidá-lo para entrar, mas ele se recusou.
Percebi aos poucos sua freqüência às aulas, até porque ele era bastante discreto. Como eu estava envolvido com a aula, com os alunos que estavam dentro da sala, preocupado em dar uma explicação ou orientar um grupo, nem notei, de início, sua presença. Não sei quando ele começou o curso, mesmo porque ele não tinha feito matrícula, muito menos seu nome constava no diário de classe.
Depois, quando me acostumei com sua presença, até me preocupava se ele estava compreendendo, se tinha dúvidas ou queria fazer algum questionamento. Mas como ele ficava do lado de fora, nunca soube como era seu aprendizado. Supondo que a iniciativa própria constitui-se em pré-requisito básico para a aprendizagem, imaginava que alguma coisa ele aprendia.
O problema era a falta de diálogo entre nós dois, pelo menos um diálogo formal, entre aluno e professor. Eu me esforçava para ser o mais claro possível, expor a matéria, quando era o caso, da maneira mais didática que eu conseguia.
Não era um diálogo de surdos, porque tanto um quanto outro ouviam perfeitamente. O problema era saber se havia entendimento, compreensão do conteúdo, pois não existia retorno. Tão pouco era uma questão de método, pois as aulas não eram, a não ser em determinados momentos, expositivas. O problema do retorno é que, como professor, com uma visão mais de orientador do que de palestrante, mais de trabalho pedagógico do que de discurso, mais de parceiro do que de representante comercial fazendo relatório de vendas ou balconista desfiando tópicos de um receituário técnico, faltavam elementos de acordo com que os pedagogos costumam chamar de processo ensino-apredizagem.
Como a sala tinha várias alunas, cheguei a pensar que ele estivesse interessado numa delas. Mesmo não tendo a confirmação, soube depois que não era essa a razão da sua, digamos, freqüência às aulas. Parece que era puro interesse mesmo.
Um dia, encerrei bruscamente a aula, dispensei os alunos e, antes que ele desse por si, eu o chamei para dentro da sala. Sua assiduidade e sua curiosidade me intrigavam. Mas incomodavam também sua passividade, seu silêncio, sua atitude de quase invisibilidade. Perguntei se gostava das aulas, se o assunto o interessava. Ele disse que sim. Perguntei se queria uma cópia dos meus apontamentos. Ele disse que não, que não saberia o que fazer com eles.
Uma das minhas frustrações, como professor, é que nem sempre quem está dentro da sala de aula quer estar lá, e quem, às vezes está fora, quer estar dentro. Não é fácil fazer a troca e isso não depende só do professor.
O “meu aluno” freqüentou pouco as aulas, pouco mais de um mês e já não o avistei mais nos corredores. A vida de professor nos obriga a correr de um lado a outro da cidade, de sala em sala, mal temos tempo de guardar o nome de todos os alunos, de dar a devida atenção a cada um deles. Esse aluno, como a maioria, passou, foi embora e nem do seu nome eu me lembro mais.
Era um dos faxineiros da escola, encarregado da limpeza das salas depois de encerradas as aulas. Chegava mais cedo para assistir às minhas aulas e cumpria, noite afora, uma extensa agenda, lendo e depois limpando as lousas, desdobrando papéis amassados, desvendando recados, fórmulas e outros escritos nas mesas e carteiras. Como não rendia no serviço, nas palavras do encarregado do setor, foi demitido com um pouco mais do que dois meses de serviço. Um caso típico de evasão escolar ou, se quiserem, exclusão pedagógica.
SOBRE O BLOG
Este blog é uma proposta aberta de leitura, de informação e de discussão sobre educação ambiental, viagens, livros, literatura e memória. A intenção é apresentar várias leituras do mundo, sempre tentando destacar as abordagens sob um viés socioambiental progressista. As principais referências são: a liberdade de expressão, a valorização da cidadania planetária e o respeito à sociobiodiversidade.
Os marcadores indicam os temas de minha preferência: crônicas, memórias, livros, educação ambiental e viagens.
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