Renato Muniz Barretto de Carvalho
Impossível ficar indiferente diante do debate acerca do futuro do livro. Vai desaparecer? Vai mudar de formato? Vai existir para sempre? Quantas perguntas! Quantas dúvidas!
Vai desaparecer. Um dia, provavelmente, vai desaparecer. Não é preciso ser muito esperto para perceber que o livro, desde que surgiu, mudou muito. Já foi um rolinho, já foi de papiro, já foi manuscrito, já foi encapado com ricas capas de couro bordadas a ouro, já foi de pano, de plástico e, hoje, existe também no formato digital, ou como livro eletrônico, frequentando o cada vez mais amplo círculo dos equipamentos eletrônicos, como os notebooks, os iPads, os e-books, os cartões de memória, os CD-roms e os pen drives, dentre outros. Nem ouso citar suas possibilidades enquanto arquivo digital, pois são tantas...
É tentador fazer uma comparação com a música e suas inúmeras formas de reprodução e registro, que não a voz humana pura e simples e os instrumentos tocados ao vivo, sem falar no rádio. Antes, foi o tempo dos fonógrafos e dos cilindros, depois vieram os famosos 78 rotações, grossos, rígidos, limitados e os gramofones. Depois surgiram os LP, ou long plays, em 33 rotações, com maiores possibilidades em termos de conteúdo e qualidade da reprodução. Em seguida, num movimento rápido e surpreendente, apareceram as já anacrônicas fitas cassetes, os CDs e os MP3, os MP4... A indústria fonográfica já anunciou o fim do CD de música para algo em torno do ano de 2020. Não gosto de profecias, mas esta é de difícil contestação. A música não vai acabar, com certeza, o que vai mudar é o meio de reprodução.
Assim como a música não vai desaparecer, o livro e a leitura também não. O que vai mudar é o seu formato. E depois de mudados, continuarão mudando, para formas que sequer imaginamos nos dias de hoje. Por que não?
Mas existem diferenças entre as formas de reprodução da música e das ideias, via leitura, que não podem ser deixadas de lado. A música, desde que não seja ao vivo, precisa sempre de um meio mecânico ou eletrônico para existir. Portanto, depende de eletricidade, de uma fonte de alimentação e de uma aparelhagem. O mesmo não ocorre com a leitura, que depende da capacidade física (visual, auditiva ou tátil), do devido letramento, portanto de cognição, e de um objeto muito simples, que não precisa de nenhuma fonte de energia para funcionar, não precisa ser ligado ou desligado, nem de qualquer tipo de aparelho para se reproduzir: o livro.
Como se sabe, o livro pode ser levado a qualquer lugar, a qualquer hora. E que seja um bom livro, bem editado, leve, gostoso de ler. Ele pode ser lido na praia, no ônibus, no banheiro, na biblioteca, nas ruas, nas praças e por aí afora... O livro eletrônico também, apesar da limitação da fonte de energia. Agora, imaginem um caro equipamento desses em dois momentos ideais para uma boa leitura: na praia, junto de um baldinho de areia e outros apetrechos típicos, ou numa cabana, em um fim de semana de pescaria.
Da minha parte, eu sinto o sono vindo e o livro deslizando suavemente pelas minhas mãos até pousar no meu peito. Fecho os olhos e apago. Quando acordo, quem está no chão, quietinho, em perfeito estado, aguardando, sem maiores traumas, o reinício da leitura?
O livro, tal como o conhecemos hoje, vai desaparecer, mas antes vai conviver por muitos e muitos anos, talvez por um tempo geológico inalcançável à nossa vã existência, com outros formatos. Boa leitura e bons sonhos.
Um comentário:
Renato, li tua crônica e me senti menos solitário: amo os livros, na mão, na mesa, folhear, ler... um praazer divino. Abraços ternos. jorge
Ps. publicarei com link se você não tiver nada contra...
Abraços, jorge
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