sábado, 17 de março de 2018

Tão somente


Tão somente

Renato Muniz B. Carvalho

É só uma árvore, dizem uns.
É só um cachorro vira-lata, dizem outros.
É só uma menina negra, dizem...
É só uma bala perdida, diz o coronel estressado.
É só um prato de comida, diz o idiota lambuzado em banquetes e festins.
É só uma reprovação, diz o burocrata ao aluno triste.
É só um tapinha, diz o brutamontes à namorada assustada.
É só uma gorjeta, diz o patrão ao operário humilhado.
É só uma esmola, diz a madame ao malabarista na rua.
É só uma bomba, dizem à menina destroçada por estilhaços na Síria.
É só um pronome atraído por um não, diz o gramático seboso.
É só uma vida sem rumo, diz o moralista de plantão.
É só um olho d’água, diz o incorporador que dirige o trator de esteira.
É só mais uma morte, diz o cara no cemitério.
São apenas alguns, dizem uns poucos.

Nenhuma estrela a menos, exige o poeta Maiakovski!
Nenhuma vida a menos, dizem os defensores dos direitos humanos!
Nenhum faminto no mundo, cobram Josué de Castro, Frantz Fanon e Betinho!
Nenhuma colônia a mais, gritam Agostinho Neto, Toussaint Louverture e Gandhi!
Nenhum veneno em nossas mesas, uma exigência sensata ecoa mundo afora!
Nenhum retrocesso, denunciam as crianças preocupadas com seu futuro!
À luta, gritam os injustiçados do mundo!
À luta!
À luta!


Apenas a luta.


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