sábado, 2 de janeiro de 2016
Tão simples como arroz com jiló
Tão simples como arroz com jiló
Renato
Muniz Barretto de Carvalho
Jiló é quase uma unanimidade. Não
concorda? Mesmo sem nunca ter provado, a maioria vai fazer cara feia e dizer
que não gosta. Pobre jiló! Virou sinônimo de comida amarga. É injusto; a iguaria
caipira, de origem africana, não merece esse tratamento. Claro, não é para
qualquer paladar, e o modo de fazer é determinante para definir o sabor.
Preparar jiló sem cuidado, sem muita paixão, é como ler um livro pulando as
páginas e depois dizer que não entendeu nada da história. Jiló é para os mais
experientes, para os mais velhos, tanto para quem vai cozinhar quanto para quem
vai comer. Não adianta forçar as crianças e os adolescentes a comerem, o
paladar deles ainda está em formação.
Jiló é planta comum nas hortas das
fazendas do interior mineiro. Se alguém descuidou ou abandonou uma horta por um
motivo qualquer, o jiló é o último a morrer, resiste bravamente até o fim. Um
desavisado até poderia pensar que se trata de uma praga, um “matinho” sem utilidade.
Bem cuidado, produz bastante e as frutas verdinhas não devem ser desprezadas.
O jiló serve também para iniciar uma
prosinha, devido às suas características polêmicas. Era uma tarde qualquer, estávamos
na varanda observando o Sol no horizonte, e apareceu o Duque, o cachorro do
Bastiãozinho. Ajeitou-se debaixo de um banquinho e ficou ali, quieto, escutando
nossa conversa. Vez ou outra soltava um suspiro. Foi quando o Bastiãozinho
falou que estava preocupado com o perdigueiro. Quisemos saber logo qual era o
motivo da preocupação. E ele disse que o danado estava entrando na horta pra
comer jiló. Foi uma risada só. Não acreditamos, mas o Bastiãozinho garantiu que
era verdade. Essa era boa! Cachorro que gostava de jiló não havia de ter muitos
no mundo.
Nunca soubemos se era troça ou se era
verdade. Dali a uns dias, o Duque foi atrás de uma cachorra no cio e nunca mais
voltou pra casa. Deve ter se apaixonado, ou encontrou uma horta cheia de
jiló.
Falando nisso, de jiló, pode-se prepará-lo
de várias maneiras, inclusive apaixonadamente, frito, assado, cozido, em
conserva, mas o melhor é misturar com outro alimento, de modo a quebrar
resistências.
Para começo de conversa, experimente
arroz com jiló. Desta forma, ganham os dois, o arroz e o jiló. Melhor dizendo,
ganham os três: o arroz, o jiló e quem vai comer! Não abuse, para não piorar a
fama desta frutinha amada por uns e odiada por outros.
Sirva com feijão, farofa, salada, o que
tiver, e você vai perceber que o jiló dá um sabor especial ao conjunto. Isso é o
que importa, a combinação de sabores, cada um cumprindo uma função. No ano que
se inicia, prepare um jiló e perceba que a vida não precisa ser tão amarga
quanto alguns querem. Bom apetite! Feliz ano novo!
Primeira crônica de 2016, no Jornal da Manhã (03/01/2016)
http://jmonline.com.br/novo/?noticias,22,ARTICULISTAS,119797
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Um comentário:
Professor Renato Muniz, como boa mineira que sou, sei apreciar jiló. E hoje por coincidência, preparei no almoço, um frango caipira ao molho, acompanhado por jiló, quiabo, polenta (angu de fubá), pimenta malagueta colhida na horta caseira, cebolinha e salsa! Na minha infância, minha avó materna tinha fogão a lenha em casa e na horta do quintal dela não faltavam: jiló, quiabo e chuchu. Então desde pequena fui acostumada a comer o amargo tão rejeitado por tantos até para os que não o conhece.
Começando o ano bem com suas crônicas que despertam várias reflexões e lembranças boas. Gosto, acompanho e adoro ler suas " impertinências" sempre tão pertinentes ao nosso cotiano. Continue sempre sendo esse bom curioso e observador que não deixa uma folha cair, um vento passar, nada desapercebido, dando o seu devido valor e nos levando a pensar. Tenha um ano de mais realizações e mais inspirações! Saúde!! Feliz 2016 e obrigada por ser esse nosso eterno Mestre!! Abraços fraternos.
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