Renato Muniz Barretto de Carvalho
Como eu gosto muito de livros, acabo comparando eles a tudo quanto há. Algumas comparações são óbvias, outras nem tanto. Livros combinam com quase tudo. Talvez isso explique a sensação que tenho de que os leitores são mais flexíveis, mais questionadores. Fuçam mais.
Fuçar é uma dessas palavras pouco usadas que às vezes a gente encontra pelo caminho. Dessas que não se acham em qualquer dicionário. Relaciona-se com focinho, nariz, fuça. Daí para o verbo fuçar foi um pulo. Entendo que é o ato de buscar, de escarafunchar, de descobrir o que há por baixo do solo, o que está escondido e precisa ser revolvido, mostrado, revelado. Estamos de acordo?
Quem viaja vai atrás de alguma coisa, busca algo. Viaja a negócios, parte em busca de oportunidades, de parentes, de amigos, procura lazer, descanso, diversão, conhecimento, cultura. O viajante é um eterno descontente, um permanente descobridor, portanto um fuçador.
O leitor também. Ele fuça, descobre histórias, se diverte, desvenda emoções, tristezas, alegrias e infindáveis sentimentos, paisagens e situações. Percorre estradas desconhecidas, vivencia circunstâncias inusitadas. Perde-se, descobre, se confunde, questiona.
Muitos não gostam de experimentar essa comiseração, preferem o abrigo, a segurança, o estável, a rotina. Quem viaja está sujeito ao imprevisto, às interrupções do caminho, às mudanças do clima e de rumo. O leitor também. Alguns não agüentam o suspense e pulam páginas, querem chegar logo ao final. Outros levam anos lendo um único livro, saboreando a estrada, longas estradas. Sempre sujeitos ao inesperado.
O que um viajante vai encontrar pela frente? Nem sempre se sabe quando a estrada é boa ou ruim, bem conservada ou péssima, cheia de buracos. Não se sabe quais serão os percalços do caminho. E a leitura? Pode-se perguntar: vou gostar deste livro? Desta crônica? O que ela tem a me dizer? A mesma coisa com a estrada, com um roteiro escolhido. Quem viaja nem sempre encontra conforto, água fresca, comida boa e roupa lavada. A leitura, igualmente, nem sempre se apresenta pronta, acabada. Daí a sensação de que, numa adaptação moderna de uma frase do filósofo Heráclito de Éfeso, nunca passamos pela mesma estrada duas vezes, assim como nunca nos banhamos na mesma água de um rio. Tudo flui, se movimenta e está em constante mudança. Experimente ler o mesmo livro duas, três vezes! Você ou o livro nunca serão os mesmos.
Livros são estradas que se abrem para a mente e para o coração. São lugares a serem explorados, como quem admira uma paisagem. Imagine um viajante num belvedere olhando um vale, uma cadeia de montanhas, um rio caudaloso ou um riozinho escondido no meio de uma densa mata, um monumento arquitetônico, uma festa popular, um show folclórico.
Livros e estradas se confundem e se misturam nas descobertas. Ler um livro é deixar um caminho sempre aberto, é se permitir percursos novos, é admitir caminhar por estradas desconhecidas. Ler um livro ajuda a saborear melhor a vida, é como fazer uma grande viagem.
2 comentários:
Estamos de acordo? Estamos!
Estou lendo Mob Dick há vários meses já, porque não quero que a leitura acabe... leio um capítulo e paro, leio outro e volto pra metade do livro, pra ler de novo e ver se não perdi algo... daqui um tempo, quando o livro acabar, acho que só fazendo uma viagem de mar pra dar conta da saudade da leitura...
E por falar em viagem, nesse exato momento estou pensando em que livro levar pra me acompanhar no feriadão que vem por aí.
Por falar em livros,estradas será que existe coisa mais prazerosa que chegar num sebo, fuçar pilhas de livros e no final ser presenteado com raros exemplares?
Bisbilhotar livros VELHOS me fascina.
vera aguiar
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