sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Chuvas, trovoadas e o clima no Cerrado: modo de usar

Renato Muniz Barretto de Carvalho

O Cerrado costuma ter dois momentos bem marcantes: um desses momentos é chamado de “tempo das chuvas” ou “tempo das águas”, geralmente vai de outubro a abril. Como o próprio nome diz, chove muito nesta época, com chuvas torrenciais, acompanhadas de muitos raios, às vezes tempestades, que derrubam árvores e assustam todo o mundo, bichos e pessoas. A temperatura esquenta, em alguns lugares os termômetros ultrapassam a marca dos 40 graus. A partir do mês de maio já esfria bem, as frentes frias do Sul começam a vir com força, e é quando chegam as chuvinhas finas, geladas, que convidam para o aconchego de um fogão de lenha.

A outra estação é a da seca, quando chove pouco, tudo fica amarelado, seco, é claro! As pastagens, os animais e as pessoas se ressentem por causa da baixa umidade. O tempo da seca, geralmente, vai de maio a setembro, às vezes se prolongam até outubro ou novembro. É quando acontecem muitos incêndios, o ar fica carregado de poeira e o céu, nos fins de tarde, adquire tons alaranjados, até vermelhos, com paisagens e flagrantes lindos.

Parece que a maioria dos habitantes dessa região não se acostuma com as mudanças e os ritmos anuais. Como alguns reclamam! No tempo das chuvas as pessoas comentam, preocupadas, que está chovendo muito, que a chuva “atrapalha” isso e aquilo. No tempo da seca é a mesma coisa, dizem que “nunca viram um ano tão seco” e outras observações curiosas, desencontradas, tão típicas, tão características nossas.

O tempo das chuvas traz preocupações com as enchentes, com os deslizamentos de encostas, mas é o tempo da fartura, das colheitas, das pastagens verdes. O solo fica encharcado e as minas d’água – se choveu bem e elas estão protegidas por árvores, por matas, e se estão em refúgios adequados – vão abastecer os reservatórios, garantir a fartura de água nas cidades e o fluxo dos rios, córregos e riachos.

O tempo da seca traz outras preocupações, principalmente com as queimadas, mas o período sem chuvas facilita a lida no campo, pois permite que vários serviços sejam executados, permite que novas formas de vida apareçam e, de certa forma, há uma preparação para o próximo período. Se ninguém retirar ou colocar fogo, as folhas secas que caírem nessa época servirão como um importante componente de proteção para a vida do solo.

Em janeiro e fevereiro ocorrem os mais altos índices de precipitação pluviométrica. Costuma chover na metade dos dias dos dois meses, isto é, em 59 dias, 31 dias de janeiro e 28 dias de fevereiro, costuma ocorrer chuva em 30 dias ou mais. Se não vier o veranico, que é um intervalo sem chuva.

É bem diferente o que acontece em julho ou agosto. São meses secos, quando torcemos por um diazinho que seja de chuva, para aliviar a poeira e a sequidão.

No tempo das chuvas, a umidade toma conta de tudo. Às vezes, uma fina camada de mofo cobre os móveis de madeira. A roupa no varal demora a secar, os motoristas sofrem com as estradas cheias de buracos. Nas várzeas e nas encostas o medo toma conta dos mais simples, miseráveis e desafortunados. Até que as chuvas diminuem e, parece, tudo volta ao normal, sem nunca ter deixado sua normalidade, se é que a natureza tem uma norma, regras fixas. Se regras existem, não são tão rígidas quanto uns querem fazer crer. Não são.

O tempo da seca traz a possibilidade de finais de semana ensolarados e, se não esfria muito, permite ousadias nas refeições, banhos de rio e duchas deliciosas em cachoeiras escondidas. O ruim é que o tempo seco prejudica a pele dos mais sensíveis, o pó que se acumula nos móveis incomoda as donas de casa e afeta a saúde dos alérgicos. Os hospitais ficam cheios de crianças com problemas respiratórios.

Nesse período, os governos e todos nós deveríamos ficar atentos para impedir e denunciar as queimadas, o desmatamento e a poluição do ar e dos cursos d’água.

O melhor de tudo isso é saber que um dia a seca termina, que a chuva volta, que o nível dos rios sobe novamente. As árvores se enchem de folhas verdes, os pássaros cantam bastante e constroem, frenéticos, seus ninhos.

Mas, é no mês de abril que o tempo nos reserva sua melhor surpresa. A paisagem ainda está bem verde, mas as chuvas diminuem. Então, aproveite para se deitar num gramado à sua escolha, num local seguro, de preferência bem cedo, ou de tardinha, e tente ouvir o coração da Terra bater. Feche os olhos, relaxe, deixe as preocupações de lado um pouco e perceba que você faz parte deste imenso e belíssimo mundo. Se você se sentir confortável, durma, e acorde só de noite, quem sabe com a sorte de ter uma estonteante e linda Lua cheia despontando no horizonte.

Publicado também no Blog do CEA Sítio da Pedreira.

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